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Quatro anos sem Robin Williams

André Barcinski

10/08/2018 05h59

Amanhã, 11 de agosto, é o quarto aniversário da morte do comediante Robin Williams. Williams se enforcou em casa, na Califórnia, aos 63 anos. A esposa declarou que ele estava deprimido depois de ser diagnosticado com um tipo de demência.

Robin Williams foi o único cara que me fez chorar de rir. Chorar mesmo. Foi em 1997, em Nova York, durante uma entrevista para o lançamento da comédia "Um Dia, Dois Pais", em que ele contracenava com o amigo Billy Crystal.

O filme era péssimo, e sua ruindade contaminou a entrevista, que se arrastava com perguntas burocráticas e respostas pouco inspiradas. Mas Williams se ocupou de acabar com o tédio: quando um jornalista, não lembro por que cargas d'água, disse que filmes europeus não tinham boa bilheteria nos Estados Unidos, Williams começou a imitar um típico caipira do interior do país analisando os filmes do cineasta espanhol Luis Buñuel.

A entrevista acabou ali: Williams passou os quatro ou cinco minutos seguintes encarnando o caipira cinéfilo. Tudo improvisado, mas com um texto absolutamente genial, que referenciava vários filmes de Buñuel e cenas clássicas, como a do olho cortado por uma navalha em "O Cão Andaluz" (1929). Ao final, todos os jornalistas presentes estavam dobrados nas cadeiras de tanto rir.

Assistindo a alguns trechos de "Robin Williams: Entre na Minha Mente", documentário da HBO (veja horários aqui), lembrei esses minutos de brilhantismo que tive a sorte de testemunhar.

O filme, dirigido por Marina Zenovich (que também fez um documentário sobre outro comediante tão talentoso quanto atormentado, Richard Pryor), mostra várias sequências de monólogos improvisados, em que Williams despeja na plateia torrentes de frases, gestos e imitações.

Sempre achei Robin Williams muito melhor que a grande maioria de seus filmes. O ator tinha propensão a aceitar papéis ruins em roteiros que beiravam a pieguice. Mas, em cima de um palco, a coisa mudava de figura: ali sua comédia realmente tinha o espaço que necessitava. Robin Williams dominava o palco como poucos.

Fora do palco, no entanto, o ator não se sentia tão à vontade. O amigo Steve Martin, entrevistado no filme, diz: "Robin sentia-se muito confortável no palco; fora dele, eu sentia que ele estava apenas tentando segurar as pontas".

O documentário conta a trajetória de Williams, da infância triste em uma família pouco afetuosa à mudança para São Francisco no auge da contracultura, no fim dos anos 60, passando pelo início da carreira no "stand up", as noites brancas de pó com amigos como Robert De Niro e John Belushi (Williams esteve com Belushi na noite em que ele morreu de overdose), e finalmente a consagração na TV e cinema.

Quem acompanha o blog sabe que escrevo bastante sobre comediantes. Recentemente fiz um texto sobre Garry Shandling, outro sobre Jim Carrey, e já escrevi sobre Steve Martin, Richard Pryor, Andy Kaufman, Eddie Murphy e John Cleese, entre outros. Acho fascinante a maneira como esses artistas transformam seus problemas em comédia. Suas vidas, de maneira geral, são parecidas: infâncias tristes, solidão, problemas familiares, e uma grande, imensa, gigantesca insegurança, que não os abandona nem depois do sucesso mundial, e que só é aplacada com os risos da plateia. Como diz outro grande amigo de Williams, Billy Crystal: "Para Robin, a melhor droga era a aceitação do público".

Para terminar, aqui vai um clipe antológico da entrega dos Prêmios da Crítica, em 2003, em que Jack Nicholson ("Confissões de Schmidt"), Daniel Day-Lewis ("Gangues de Nova York") e Robin Williams ("Retratos de uma Obsessão") disputavam o prêmio de melhor ator. O resultado foi um empate entre Nicholson e Day-Lewis, deixando Williams de fora. Mas Nicholson, visivelmente "calibrado" (ele mesmo diz: "Isso é o que acontece quando você dá bebida de graça para um irlandês"), chama Williams para o palco. O resto é história…

P.S.: Esse texto estava programado para publicação quando eu soube da morte do cantor e compositor Guilherme Lamounier, aos 67 anos. Deixo aqui um depoimento do pesquisador Marcelo Fróes, do selo Discobertas, sobre o trabalho de Lamounier, um artista que havia sumido da cena artística há mais de 30 anos:

Um ótimo fim de semana a todos.

Visite meu site: andrebarcinski.com.br

Sobre o autor

André Barcinski é jornalista, roteirista e diretor de TV. É crítico de cinema e música da “Folha de S. Paulo”. Escreveu sete livros, incluindo “Barulho” (1992), vencedor do prêmio Jabuti de melhor reportagem. Roteirizou a série de TV “Zé do Caixão” (2015), do canal Space, e dirigiu o documentário “Maldito” (2001), sobre o cineasta José Mojica Marins, vencedor do Prêmio do Júri do Festival de Sundance (EUA). Em 2019, dirigiu a série documental “História Secreta do Pop Brasileiro”.

Sobre o blog

Música, cinema, livros, TV, e tudo que compõe o universo da cultura pop estará no blog, atualizado às terças-feiras.