Ben Bradlee: jornalista popstar (e o novo projeto de Allan Sieber!)
André Barcinski
26/02/2018 05h59
Em tempos de "fake news" e jornalista que não entende a diferença entre cobertura e assessoria de imprensa, dá uma certa tristeza ver "O Homem do Jornal", documentário da HBO sobre Ben Bradlee.
Bradlee (1921-2014) teve uma carreira brilhante no jornalismo, primeiro nos anos 1950, como correspondente europeu da revista "Newsweek", e depois como editor do jornal "The Washington Post" (1968 a 1991).
Foi durante a gestão de Bradlee que o "Post" publicou duas séries de reportagens históricas: a primeira em 1971, com a transcrição dos "Papéis do Pentágono", um volume imenso de documentos secretos que descreviam o envolvimento político e militar dos Estados Unidos no Vietnã de 1945 a 1967, e a segunda em 1972, com a investigação dos repórteres Bob Woodward e Carl Bernstein sobre o escândalo de Watergate, que culminaria com a renúncia do então presidente norte-americano Richard Nixon, em 1974.
Os "Papéis do Pentágono" e o escândalo de Watergate foram dois momentos importantes da carreira de Bradlee (detalhados em dois filmes muito bons, respectivamente "The Post", de Steven Spileberg,
atualmente em cartaz, e "Todos os Homens do Presidente", dirigido por Alan J. Pakula em 1976). No primeiro, Bradlee foi interpretado por Tom Hanks; no segundo, por Jason Robards.
Mas o documentário (veja horários aqui) não se limita a contar esses triunfos, e dá uma geral em toda a vida do jornalista, de sua infância confortável numa família tradicional de Boston à sua relação de amizade e admiração por John Kennedy, passando pelos fracassos de seus casamentos e o escândalo das reportagens falsas escritas pela repórter Janet Cooke no início dos anos 1980, que abalaram a credibilidade do "Post".
O filme não canoniza Bradlee. Entrevistados questionam sua ética jornalística nas passagens sobre sua relação com Kennedy, e criticam o desleixo do "Post" na edição das reportagens falsas de Janet Cooke.
Mesmo assim, com falhas que o próprio Bradlee reconheceu, sua trajetória é brilhante. Foi um defensor ardoroso da liberdade de imprensa, numa época em que bater de frente com Richard Nixon parecia suicídio comercial. Suas entrevistas ("Não acho que o senhor Nixon tem o direito de dizer o que o público pode ou não ler") são incríveis, e sua coragem em desafiar governos, ignorando questões comerciais que poderiam prejudicar o "Post", são exemplo da importância da separação entre a redação e o departamento comercial.
Para quem ama jornalismo, o documentário provoca sensações ambivalentes: ao mesmo tempo em que é emocionante conhecer os bastidores de coberturas que mudaram o mundo e lembrar uma época em que jornais tinham papel de destaque na defesa das liberdades individuais, é triste comparar o período do apogeu de Ben Bradlee com hoje em dia, quando o público acha normal se informar por redes sociais.
O NOVO PROJETO DE CROWDFUNDING DE ALLAN SIEBER
Meu amigo Allan Sieber está com um novo projeto na praça. O próprio Allan explica:
Minha nova empreitada é um diário online com 4 atualizações semanais.
Isso está no APOIA-SE, uma plataforma para pessoas como eu (que faliram um estudio de animação, fracassaram na social para manter o emprego de roteirista na TV, e, por fim, foram dispensadas da Folha – onde publicavam tiras diárias por anos – por motivos nebulosos) se sustentarem através de sua produção.
Aqui o link do APOIA-SE:
Funciona assim:
Todo cidadão ou cidadão que se dispuser pagar a quantia de 10 reais mensais tem acesso a meu diário desenhado, com 4 atualizações por semana. Isso é publicado em um blog onde só os assinantes terão a senha. O conteúdo está liberado para não assinantes até 10 de março; confira aqui. Também haverá a cada mês sorteio de um desenho meu entre os assinantes. Quem pagar 100 reais, além de participar do sorteio, ao final de 12 meses receberá em casa uma tela minha (30 x 40cm, tinta acrilica).
Sobre o autor
André Barcinski é jornalista, roteirista e diretor de TV. É crítico de cinema e música da “Folha de S. Paulo”. Escreveu sete livros, incluindo “Barulho” (1992), vencedor do prêmio Jabuti de melhor reportagem. Roteirizou a série de TV “Zé do Caixão” (2015), do canal Space, e dirigiu o documentário “Maldito” (2001), sobre o cineasta José Mojica Marins, vencedor do Prêmio do Júri do Festival de Sundance (EUA). Em 2019, dirigiu a série documental “História Secreta do Pop Brasileiro”.
Sobre o blog
Música, cinema, livros, TV, e tudo que compõe o universo da cultura pop estará no blog, atualizado às terças-feiras.