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“OK Computer”: o último álbum clássico do rock

André Barcinski

11/09/2017 05h59


Estou há semanas ouvindo "OKNOTOK: 1997-2017", a versão remasterizada e expandida de "OK Computer", álbum que o Radiohead lançou há 20 anos.

Mais que ouvir "OK Computer" pela enésima vez, meu interesse era conhecer as três faixas inéditas – "I Promise", "Man Of War" e "Lift" – e ouvir os lados B incluídos no relançamento. Mas logo passei a fazer algo que não fazia há um bom tempo: ouvir "OK Computer" pela enésima vez.

Alguns discos são tão marcantes durante uma determinada época, que você tende a deixá-los de lado com o passar do tempo. Quantas dezenas de vezes alguém pode ouvir "Nevermind" ou "Rocket to Russia" antes que as incontáveis repetições subtraiam a surpresa e força das canções?

"OK Computer" é um desses discos onipresentes e que já fazem parte da paisagem. Mas esse relançamento serviu para recolocá-lo no posto que merece: o de último álbum clássico do rock. E por "clássico" quero dizer um álbum de qualidade inquestionável, que influenciou muitos outros artistas e serve de parâmetro para um determinado estilo de som.

A lista de gente que imitou o Radiohead é imensa: de Muse a National, de Arcade Fire a Coldplay, de Travis a Midlake, de Sigur Rós a The XX. A guinada experimental da banda em "OK Computer" influenciou até veteranos como Flaming Lips e Beck a buscarem caminhos diferentes para sua música.

Se hoje a sonoridade um tanto sombria, etérea, eletrônica e dub de "OK Computer" está por todo lado, em 1997 foi um choque. É preciso lembrar que o disco veio na esteira do grunge e do britpop, dois gêneros esteticamente simplistas e retrô.

O que o Radiohead fez em "OK Computer" foi mexer em time que estava ganhando: depois de lançar "The Bends" (1995), um excelente disco de guitarras pesadas e que fez imenso sucesso comercial, a banda decidiu explorar um caminho totalmente novo e arriscado.

"OK Computer" juntava dub, o "krautrock" de Can e Neu!, as texturas ambient de Brian Eno, a eletrônica lúgubre de Massive Attack e Portishead, enfim, uma série de elementos que fugiam do que a banda havia feito até então.

A fortuna que ganhou com "The Bends" motivou a gravadora Parlophone a dar uma boa grana para o Radiohead comprar instrumentos e aparelhagem. A Parlophone também pagou o aluguel de uma mansão do século 16, onde a banda se enfurnou – sem prazo – para gravar seu terceiro disco.

O apoio financeiro da gravadora ajudou a tornar "OK Computer" um disco tão bom. Gravações custam caro, especialmente uma tão longa e ambiciosa. E talvez por isso nenhum disco depois desse tenha causado tanto impacto no rock. "OK Computer" nasceu nos últimos estertores da bonança financeira das gravadoras, um pouco antes do declínio em vendas causado pela Internet no início dos anos 2000.

Hoje, o próprio conceito de "álbum" parece ter acabado. Num mercado tão ruim, em que artistas ganham muito mais fazendo shows do que vendendo discos, que bandas têm grana e disposição para gastar na composição e gravação de um disco ambicioso como aquele?

Nos últimos 20 anos, muitas bandas de rock fizeram excelentes discos, mas nenhum chega perto de "OK Computer" em termos de influência e perenidade. Posso estar esquecendo algum? Sugestões, por favor…

HOLGER CZUKAY R.I.P.

Aproveitando o texto sobre o Radiohead, que tal explorar a carreira de um sujeito que influenciou demais a Thom Yorke e Johnny Greenwood? Esse era Holger Czukay, baixista e fundador do grupo alemão Can. Veja Czukay (é o bigodudo sem camisa) tocando com o Can na TV alemã, em 1971:

Czukay, um dos grandes nomes da música de vanguarda dos últimos 50 anos, morreu semana passada, aos 79 anos. Sugiro ouvir os discos "Tago Mago" (1971) e "Future Days" (1973).

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Sobre o autor

André Barcinski é jornalista, roteirista e diretor de TV. É crítico de cinema e música da “Folha de S. Paulo”. Escreveu sete livros, incluindo “Barulho” (1992), vencedor do prêmio Jabuti de melhor reportagem. Roteirizou a série de TV “Zé do Caixão” (2015), do canal Space, e dirigiu o documentário “Maldito” (2001), sobre o cineasta José Mojica Marins, vencedor do Prêmio do Júri do Festival de Sundance (EUA). Em 2019, dirigiu a série documental “História Secreta do Pop Brasileiro”.

Sobre o blog

Música, cinema, livros, TV, e tudo que compõe o universo da cultura pop estará no blog, atualizado às terças-feiras.