Duas décadas depois, um encontro (nunca visto) entre dois gigantes do samba
Em meados dos anos 1990, eu morava em Nova York e comecei o projeto de um documentário sobre a história do samba. Vim ao Brasil algumas vezes, por conta própria, e entrevistei músicos e historiadores, com a intenção de esboçar um roteiro para o filme.
Em 1996, um dos entrevistados, o cantor e compositor Nelson Sargento, me procurou para informar que Carlos Cachaça, à época com 94 anos de idade, estava muito mal de saúde, e que talvez fosse prudente filmá-lo logo.
Carlos é um pioneiro do samba carioca. Nascido em 1902, foi um dos fundadores da Mangueira, em 1928, e compôs sambas clássicos, vários em parceria com o amigo Cartola. Em 1996, era o último sobrevivente entre os fundadores da Mangueira.
Nelson Sargento, embora 22 anos mais novo que Carlos, sabia tudo sobre a Mangueira. Cantor, compositor, pesquisador do samba e pintor, Nelson viveu na adolescência na casa de Alfredo Português, compositor da escola. Conheceu de perto Cartola, Nelson Cavaquinho, Carlos Cachaça, Jamelão, e todos os nomes importantes da história da Mangueira. Ninguém melhor do que Nelson, portanto, para entrevistar Carlos.
Vim ao Brasil, arrumei uma ótima equipe, com meus amigos Heitor D'Alincourt na produção e Fernando Lemos a cargo da fotografia, e filmamos, em 16 mm, o encontro de Carlos e Nelson, na casa do primeiro, no Morro da Mangueira.
Apesar da fragilidade física, Carlos deu um depoimento muito bonito e cantou alguns de seus sambas.
A entrevista toda durou cerca de 45 minutos. Editei as melhores partes e fiz uma versão de 23 minutos, que legendei em inglês, para tentar atrair investidores internacionais. Também busquei financiadores no Brasil.
Depois de dois ou três anos tentando conseguir grana para o filme, sem sucesso, desisti. O material ficou guardado em caixas.
Vinte e um anos depois da entrevista, em julho de 2017, reencontrei Nelson durante um debate na Casa Folha, na FLIP. Ele havia acabado de completar 93 anos, quase a mesma idade de Carlos quando o entrevistamos. Lembrei que aquela entrevista ainda era inédita, deixei a preguiça de lado, tirei a fita U-matic embolorada do armário e pedi a meus amigos da produtora Kuarup para digitalizá-la.
A fita estava em condição ruim, já bastante mofada, e som e imagem não haviam sido tratados. Mesmo assim, dá para assistir.
Fica aqui essa pequena homenagem a dois nomes fundamentais de nossa música…
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