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Dancinha pró-Temer: esculhambaram (de novo!) com Benito Di Paula

André Barcinski

28/10/2017 05h59

A dancinha do deputado Carlos Marun (PMDB-MS), celebrando a vitória na votação da rejeição à denúncia contra o presidente Michel Temer, irritou quase todo o país. Mas uma pessoa ficou especialmente enfurecida: o cantor e compositor Benito Di Paula. A música que Marun entoava enquanto requebrava as cadeiras era "Tudo Está No Seu Lugar", que Benito gravou em 1976. O cantor, com razão, chiou (leia aqui).

Não foi a primeira vez que a canção foi usada com fins "políticos" – e sem a anuência de Benito.

Nos anos 1970, Benito era um dos maiores vendedores de discos do país. Mas a fama lhe trouxe alguns problemas, especialmente quando parte da esquerda brasileira começou a tachá-lo de conformista e alienado. Letras otimistas e alegres, como a de "Tudo Está No Seu Lugar", não caíam bem numa época em que os militares controlavam o país à força.

Curiosamente, a turminha da patrulha ideológica nunca falou nada sobre Jorge Ben, que, em pleno governo Médici, escreveu "Brasil, Eu Fico", uma patriotada gravada por Wilson Simonal: "Este é o meu Brasil / cheio de riquezas mil/ este é o meu Brasil / futuro e progresso do ano 2000 / quem não gostar e for do contra / que vá prá…". Talvez porque Benito não frequentasse o Leblon e nem era amigo do pessoal do "Pasquim", vai saber…

Benito – ou Uday Veloso, seu nome de batismo – veio de uma família pobre de Nova Friburgo, interior do Estado do Rio. Tinha 15 irmãos e aprendeu música em saraus promovidos pelo pai, ferroviário e músico amador. No início dos anos 1960, começou a cantar e a tocar piano em boates e puteiros de Copacabana e Santos. Em 1974, explodiu com "Meu Amigo Charlie Brown", inspirado em um gibi do famoso personagem criado por Charles Schulz.

Quase 40 anos depois, o patrulhamento que sofreu ainda mexe com o com o artista. Em 2014, ele me disse: "No início da minha carreira, fui chamado de brega e cafona, e depois de defensor do governo. Quem fala isso, porém, é burro pra caralho! Por que não vieram me perguntar?". Benito garante que a letra de "Tudo Está No Seu Lugar", diferentemente do que muita gente pensa, não tinha nada de política ou conformista: "Compus a música depois de dar uma casa de presente para minha mãe. E a letra falava sobre a minha alegria naquele momento, não tinha porra nenhuma a ver com política."

P.S.: Adiantei esse texto, que estava originalmente programado para segunda. O blog volta com um texto inédito na quarta, dia 1. Até lá.

Sobre o autor

André Barcinski é jornalista, roteirista e diretor de TV. É crítico de cinema e música da “Folha de S. Paulo”. Escreveu sete livros, incluindo “Barulho” (1992), vencedor do prêmio Jabuti de melhor reportagem. Roteirizou a série de TV “Zé do Caixão” (2015), do canal Space, e dirigiu o documentário “Maldito” (2001), sobre o cineasta José Mojica Marins, vencedor do Prêmio do Júri do Festival de Sundance (EUA). Em 2019, dirigiu a série documental “História Secreta do Pop Brasileiro”.

Sobre o blog

Música, cinema, livros, TV, e tudo que compõe o universo da cultura pop estará no blog, atualizado às terças-feiras.