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Comitê Olímpico é medalha de ouro em cara de pau

André Barcinski

25/08/2017 05h59


A Olimpíada de 2016 não foi a causa da falência do Rio de Janeiro, mas simboliza a fulminante decadência do estado. Mesmo para um país acostumado a pagar caro por elefantes brancos – e aí estão os monstrengos bilionários e vazios da Copa do Mundo para não nos deixar mentir – impressiona a rapidez com que os aparelhos olímpicos foram abandonados. Poucos meses depois de Phelps, Bolt e a imprensa internacional voltarem para suas casas, nossas instalações olímpicas já tinham virado malocas.

Para piorar, o Rio de Janeiro também foi abandonado. Hoje temos um estado falido, sem condição de pagar seus funcionários, com cidades vivendo praticamente em guerra civil e policiais e civis morrendo em números recordes. O ex-governador, Sérgio Cabral, um dos maiores defensores da Olimpíada, está em cana, assim como vários empreiteiros que conspiraram junto a ele para saquear os cofres públicos.

Nada disso é novidade para os brasileiros e, em especial, para os fluminenses. O mundo inteiro sabe do caos que tomou conta do Rio de Janeiro. Desde o fim dos Jogos, a imprensa internacional vem noticiando o abandono e prejuízos que a Olimpíada trouxe para o Rio. Recentemente, a ESPN internacional fez essa ótima reportagem, que conta, além dos inúmeros casos de corrupção e abandono, a triste vida pós-Olimpíada de alguns atletas brasileiros que venceram medalhas nos Jogos.

Mas existe uma turma que parece viver num universo paralelo, em que a Olimpíada foi um triunfo de superação e deixou um legado importante para o Rio. Falo do Comitê Olímpico Internacional. Um ano depois dos Jogos, esse bando de caras de pau continua inundando caixas postais com notícias absolutamente falsas e vídeos com histórias edificantes da Olimpíada. É um escárnio.

No fim da semana passada, o COI enviou um boletim que trazia, além de um alegre vídeo com bastidores da abertura dos Jogos, o link para uma série chamada "Cinco Vidas" ("Cinco brasileiros comuns testemunham o poder de transformação de uma Olimpíada") e um vídeo enaltecendo o campo de golfe dos Jogos ("Veja como os jovens estão levando seus sonhos mais longe no campo de golfe, um ano após os Jogos").

Em que planeta vivem essas pessoas?

Para quem quiser ter uma visão mais realistas sobre o tal campo de golfe, sugiro a leitura de duas reportagens: a primeira foi publicada em fevereiro de 2017 pelo jornal "O Globo", e tem por título: "Contrapartidas sociais de campo de golfe olímpico ainda não saíram do papel". A segunda é mais recente, tem duas semanas, é da Agência Estado, e diz: "Ex-prefeito Eduardo Paes vira réu por campo de golfe na Olimpíada".

E para quem ainda acredita no "poder de transformação" dos Jogos Olímpicos do Rio, sugiro essa reportagem especial do UOL intitulada "Olimpíada na Lama".

Um ótimo fim de semana a todos.

Sobre o autor

André Barcinski é jornalista, roteirista e diretor de TV. É crítico de cinema e música da “Folha de S. Paulo”. Escreveu sete livros, incluindo “Barulho” (1992), vencedor do prêmio Jabuti de melhor reportagem. Roteirizou a série de TV “Zé do Caixão” (2015), do canal Space, e dirigiu o documentário “Maldito” (2001), sobre o cineasta José Mojica Marins, vencedor do Prêmio do Júri do Festival de Sundance (EUA). Em 2019, dirigiu a série documental “História Secreta do Pop Brasileiro”.

Sobre o blog

Música, cinema, livros, TV, e tudo que compõe o universo da cultura pop estará no blog, atualizado às terças-feiras.