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Não confie nos “críticos” do Netflix

André Barcinski

03/05/2017 05h59


Fiquei tão impressionado com o filme francês "Les Cowboys" (leia minha crítica aqui), dirigido por Thomas Bidegain, que decidi rever outros três filmes roteirizados por Bidegain e dirigidos por Jacques Audiard: "O Profeta" (2010), "Ferrugem e Osso" (2012) e "Dheepan" (2015).

São três filmes extraordinários e que estão no catálogo do Netflix.

O surpreendente foi perceber que pelo menos dois deles – "Ferrugem e Osso" e "Dheepan" – apareciam para mim pessimamente avaliados pelos espectadores (recentemente as avaliações médias pararam de aparecer nos filmes; se não me engano, "Dheepan" tinha uma estrela em cinco e "Ferrugem e Osso", duas).

Fico imaginando quantas pessoas não perdem chances de ver bons filmes por confiar nas opiniões de pessoas que elas nem conhecem.

Fiz uma busca no Netflix de filmes que considero ótimos e selecionei algumas pérolas entre os comentários de espectadores. Divirta-se:

Caminhos Perigosos (Martin Scorsese, 1973)

"Achei um filme bem medíocre, parado, diálogos idiotas, pouquíssima profundidade nos personagens e muita demora pra mudança das cenas."

Best of Enemies (Morgan Neville e Robert Gordon, 2015)

Excelente documentário sobre uma série de programas de TV que colocou frente a frente o conservador William F. Buckley e o liberal Gore Vidal.

"Dei três estrelas pelo viés nitidamente tendencioso em prol de uma figura insignificante no meio cultural como Gore Vidal."

Onde os Fracos Não Têm Vez (Joel e Ethan Coen, 2007)

"Pra quem gosta de filmes que você tem que interpretar as falas muito mais do que as cenas, que têm um significado por trás dos acontecimentos, vai gostar. Pra quem prefere ver desenvolvida a trama principal, acho que vai decepcionar."

"Quando chega um pouco mais da metade do filme fica muito ruim as conclusões (sic) que o próprio filme pede."

Fogo Contra Fogo (Michael Mann, 1995)

"Eu não sou de comentar os filmes, mas quem quiser perder todo o seu tempo, pode assistir. Boa sorte! De Niro no final não era pra ter morrido. Era pra ter escapado com a amada. Péssimo final."

Sob a Pele (Jonathan Glazer, 2014)

"É o pior filme que vi na minha vida. Terrível, chato, sem sentido, uma total perda de tempo."

"Uma dica aí pessoal, quando eu não entendo o filme, não falo nem bem nem mal. Se eu não tiver paciência pra assistir de novo e entender, fico na minha. Isso atrapalha as pessoas que vem (sic) nos comentários pra saber qual é a do filme. Deixem pra quem entendeu comentar."


O Caso Galápagos: Quando Satã Veio ao Paraíso (Daniel Geller e Dayna Goldfine, 2013)

Esse documentário fascinante conta a história de diversos personagens que se reúnem, em 1929, no fim do mundo: as Ilhas Galápagos, um arquipélago de ilhas vulcânicas a 900 km da costa do Equador. A história é bizarra demais para resumir aqui, mas posso dizer que a trama vira um caso policial com direito a dois possíveis assassinatos. Recomendei demais o filme aqui no blog, mas parece que muita gente não gostou…

"O filme é uma grossa porcaria. Muito chato! Não merece ser assistido. Mal concebido e pessimamente dirigido."

"É xatooo não é pra quem quer uma série de investigação!"

O Profeta (Jacques Audiard, 2010)

Para mim, o melhor filme de 2010. Para outro…

"O filme começa bem, mas após o trigésimo minuto entra num marasmo. Insuportáveis são as longas cenas com fundo musical americano – são os franceses querendo fazer um tipo de gringo. Enfim não percam tempo."

Ferrugem e Osso (Jacques Audiard, 2012)

"Se você está procurando um filme com grande roteiro, super produção ou qualquer coisa semelhante, não veja esse filme. Mas se procura algo leve, com foco muito mais no comportamento humano… vai fundo."

Detalhe: no filme, classificado como "leve" pelo crítico, a atriz Marion Cottilard faz uma adestradora de orcas que é atacada por uma de suas "pupilas", perde as duas pernas e depois começa um relacionamento erótico com um desajustado que ganha a vida participando de lutas de MMA ilegais na rua.

Sobre o autor

André Barcinski é jornalista, roteirista e diretor de TV. É crítico de cinema e música da “Folha de S. Paulo”. Escreveu sete livros, incluindo “Barulho” (1992), vencedor do prêmio Jabuti de melhor reportagem. Roteirizou a série de TV “Zé do Caixão” (2015), do canal Space, e dirigiu o documentário “Maldito” (2001), sobre o cineasta José Mojica Marins, vencedor do Prêmio do Júri do Festival de Sundance (EUA). Em 2019, dirigiu a série documental “História Secreta do Pop Brasileiro”.

Sobre o blog

Música, cinema, livros, TV, e tudo que compõe o universo da cultura pop estará no blog, atualizado às terças-feiras.