Blog do Barcinski http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br André Barcinski é jornalista, roteirista e diretor de TV. É crítico de cinema e música da “Folha de S. Paulo”. Tue, 21 Apr 2020 09:00:55 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 “A Máfia dos Tigres” é bizarro e divertido – só não chame de documentário http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2020/04/21/a-mafia-dos-tigres-e-bizarro-e-divertido-so-nao-chame-de-documentario/ http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2020/04/21/a-mafia-dos-tigres-e-bizarro-e-divertido-so-nao-chame-de-documentario/#respond Tue, 21 Apr 2020 09:00:55 +0000 http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/?p=3008

“A Máfia dos Tigres”, da Netflix, é um grande sucesso de público, e não é difícil entender as razões de sua popularidade.

A minissérie une elementos de vários gêneros que sempre fizeram sucesso na TV: novelas, “reality shows”, programas policiais tipo Sikera Júnior e exploração do Mundo Cão, tudo embalado por uma estética kitsch de novela bíblica da Record. Adicione sexo, crime, animais fofinhos e feras assassinas, e você tem uma receita infalivelmente apelativa.

O que não tira os méritos da empreitada. O produto é muito bom, inteligentemente realizado e feito por quem sabe manipular o telespectador. Só não chamem de documentário, por favor.

Porque a narrativa de “A Máfia dos Tigres” é tão manipulada, tão artificialmente feita para obter máximo impacto dramático, que é difícil separar fato de ficção.

Veja bem, não estou dizendo que documentaristas são artistas de alma pura, que só dizem a verdade e fazem filmes 100% isentos. Qualquer trabalho documental é manipulado. Quando você filma uma entrevista e escolhe exibir apenas trechos dela, está manipulando fatos. Quando você escolhe uma pessoa para ser entrevistada em detrimento de outra, está indicando a direção que deseja para seu documentário.

O que importa é o limite de manipulação que o espectador está disposto a tolerar. Se ele assiste a um filme documental e acredita que o realizador exibiu uma visão equilibrada dos fatos e demonstra credibilidade jornalística, o espectador tende a embarcar com mais interesse na história.

Infelizmente, não é o caso de “A Máfia dos Tigres”. A minissérie funciona como entretenimento, mas é jornalisticamente inepta. No meio do segundo episódio – são oito – eu já estava me sentindo completamente enganado. A impressão é de que os diretores Eric Goode e Rebecca Chaiklin, quando confrontados com algum fato que atrapalhava sua história, o distorciam para caber na narrativa, ou pior: simplesmente o ignoravam.

ATENÇÃO: O TRECHO A SEGUIR CONTÉM SPOILERS

“A Máfia dos Tigres” gira em torno da briga de dois personagens, ambos ligados ao mundo dos colecionadores de grandes felinos: Joe Exotic, dono de um parque temático de tigres, leões e jacarés em Oklahoma, e Carole Baskin, diretora de uma entidade na Flórida que combate o funcionamento de zoológicos particulares nos Estado Unidos. O trabalho de Baskin consiste em receber animais que foram resgatados de circos, zoológicos particulares e criadores.

Desde o início do filme, Joe Exotic aparece na cadeia. Não sabemos ainda por que ele está lá, mas fica claro que o sujeito cometeu algum crime. No entanto, ele é retratado como o “herói” do filme, mostrado como um doido de pedra, mas engraçado e divertido em sua bizarrice.

Carole Baskin, em contrapartida, é exibida como uma desgraçada manipuladora, uma hipócrita que também enjaula filhotes de tigre enquanto protesta por Joe Exotic fazer o mesmo.

Mas a verdade – basta uma pesquisa na Internet – não é bem assim. A entidade de Baskin, a Big Cat Rescue, é conhecida por fazer um trabalho importante de lobby contra a exploração de felinos e animais selvagens. Há várias reportagens na imprensa norte-americana com entrevistas de pesquisadores e ativistas que elogiam o trabalho de Baskin. Isso não aparece na minissérie.

Em “A Máfia dos Tigres”, Joe Exotic reclama que Baskin mantém seus animais em jaulas pequenas e apertadas. Baskin é mostrada em fotos ao lado de leões e leopardos confinados em espaços diminutos. Mas essa reportagem do “The New York Times” mostra que a acusação não procede. As jaulas mostradas não são os lugares onde os animais normalmente ficam, mas espaços para onde eles são levados quando precisam ser tratados ou receber medicação.

Os diretores de “A Máfia dos Tigres” poderiam ter esclarecido esse ponto. Por que não o fizeram? Talvez porque isso tornaria Carole Baskin menos “vilã”?

A minissérie é cheia dessas pegadinhas, de omissões ou distorções de fatos que só servem para tornar a narrativa mais empolgante, mesmo que a verdade saia prejudicada. Até os clipes musicais de Joe Exotic – engraçadíssimos – são pegadinhas, porque a série esconde que ele não cantou na maioria deles, mas foi dublado por um cantor de verdade:

No fim do segundo episódio, há uma cena absolutamente constrangedora e que evidencia a tática apelativa dos realizadores: durante uma entrevista com um antigo funcionário de Joe Exotic, o sujeito casualmente menciona que o primeiro marido de Carole Baskin, um milionário chamado Don Lewis, havia sumido misteriosamente. O diretor da minissérie, Eric Goode, aparece ao lado do sujeito e diz, fingindo surpresa: “Como assim? O marido dela sumiu?”. O episódio seguinte é inteiramente dedicado à história do sumiço de Don e das suspeitas – repito, SUSPEITAS – de que Carole Baskin teve algo a ver com aquilo.

Ora, alguém precisa ser muito idiota para achar que um cineasta que está trabalhando num projeto desses não conhece os detalhes da vida de seus entrevistados. É óbvio que o diretor Goode sabia do sumiço do marido de Baskin, um caso que teve ampla repercussão nos Estados Unidos, com reportagens na revista “People” e em programas policiais de TV como “Hard Copy”. É inaceitável que Goode se preste ao papel de fingir surpresa com uma “revelação bombástica”.

As cascatas, omissões e pistas falsas se sucedem aos montes, e a cada cena supostamente “documental” claramente armada para atiçar o espectador, meu interesse por “A Máfia dos Tigres” foi diminuindo. No quinto episódio, quando Joe Exotic se candidata a governador de Oklahoma, há uma cena em que ele assiste na TV à cobertura da contagem de votos, e Joe aparece na tela em terceiro lugar, com 19% dos votos. O espectador certamente pensou: “Nossa, como é que um louco desses teve 19% dos votos do Estado de Oklahoma?”. O que a minissérie convenientemente “esqueceu” de explicar é que Joe Exotic nem chegou a disputar a eleição para governador. A eleição mostrada é a primária que escolheria o candidato do nanico Partido Libertário. Joe foi o terceiro colocado (de três!) na primária do Partido Libertário. Na verdadeira eleição para governador, o candidato Libertário acabou com pouco mais de 3% dos votos.

Enfim, “A Máfia dos Tigres” é um entretenimento de primeira, um “fast food” audiovisual que cai bem em noites de quarentena devorando um balde de pipoca. Mas não dá para levá-lo a sério como documentário. Fico imaginando o que cineastas geniais e com um gosto pelo bizarro, como Errol Morris ou Werner Herzog, teriam feito com esses personagens…

Uma ótima semana a todos.

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Sete documentários para ver na quarentena (e adeus ao PASV, um ícone de SP) http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2020/04/14/sete-documentarios-para-ver-na-quarentena-e-adeus-ao-pasv-icone-de-sp/ http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2020/04/14/sete-documentarios-para-ver-na-quarentena-e-adeus-ao-pasv-icone-de-sp/#respond Tue, 14 Apr 2020 09:00:24 +0000 http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/?p=2988

Capitão McCluskey (Sterling Hayden) é morto por Michael Corleone (Al Pacino) em “O Podersoso Chefão”


Aqui vão sete excelentes documentários, de plataformas e temas diversos, para ver na quarentena. Sem ordem de preferência:

CRIP CAMP (James Lebrecht e Nicole Newnham, 2020)
Há muito tempo eu não via um documentário tão comovente. Produzido pelos Obama e disponível na Netflix, o filme começa em 1970 e conta a história de vários adolescentes que frequentavam o Camp Jened, um acampamento de verão para pessoas com todo tipo de deficiência, localizado no Estado de Nova York. Vários desses jovens se tornaram ativistas e tiveram papel fundamental na luta pelos direitos dos deficientes nos Estados Unidos. As histórias pessoais são lindas, e a maneira adulta e bem humorada como o filme trata os personagens foge da pieguice e comiseração que costumam atacar filmes dessa temática.
Disponível na Netflix. Veja aqui.

PHAROS OF CHAOS (Manfred Blank e Wolf-Eckart Buhler, 1983)
O grande público conhece o ator Sterling Hayden (1916-1986) como McCluskey, o policial que é morto por Michael Corleone (Al Pacino) em “O Poderoso Chefão”, mas poucos sabem a vida incrível que ele teve. Filho único uma família miserável, venceu a fome e a Grande Depressão trabalhando como marujo em veleiros desde a adolescência. Aos 17 anos, já era capitão de uma imensa escuna e enfrentou os mares mais brutais do planeta. Virou astro hollywoodiano e largou tudo para combater Hitler. Foi herói de guerra, comandando barcos americanos na luta contra nazistas. Nos anos 50, foi acusado de ser comunista e, ameaçado de perder a guarda dos filhos, colaborou com os tribunais que caçaram “vermelhos”, decisão que o atormentou por toda a vida. Quando a ex-mulher ameaçou lhe tirar os quatro filhos, pegou as crianças, botou-as dentro de seu veleiro Wanderer e rumou para o Taiti, abandonando o cinema. Este filme mostra Hayden vivendo em um barco na França, garrafa de uísque na mão, contando “causos” impressionantes. E para quem se interessa, recomendo “Wanderer”, a autobiografia de Sterling Hayden.
Disponível no MUBI. Veja aqui.

MARIELLE – O DOCUMENTÁRIO (Caio Cavechini, 2020)
Série documental em seis episódios sobre os assassinatos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. Um trabalho jornalístico meticuloso, que conta não só detalhes do crime e da investigação que prendeu o PM reformado Ronnie Lessa e o ex-PM Élcio Vieira, mas também relata a trajetória de vida de Marielle desde a infância, passada na Favela da Maré, no Rio de Janeiro. Esperamos por um sétimo episódio, com a conclusão das investigações e a descoberta do mandante.
Disponível na Globoplay. Veja aqui.

MARIANNE & LEONARD: WORDS OF LOVE (Nick Broomfield, 2019)
Se você é fã de Leonard Cohen, também conhece Marianne Inhen, mesmo que indiretamente: a norueguesa Inhen foi a musa de Cohen e o inspirou a compor algumas de suas músicas mais bonitas, como “So Long, Marianne”, “Bird on a Wire” e “Hey, That’s No Way To Say Goodbye”. Os dois se conheceram na ilha de Hydra, na Grécia, nos anos 1960, e permaneceram amigos até o fim. Quando Marianne foi diagnosticada com leucemia, Leonard escreveu uma carta: “Estou atrás de você, perto o suficiente para pegar sua mão. Este velho corpo desistiu, assim como o seu desistiu também. Tenha uma viagem segura, velha amiga. Te vejo na estrada”. Marianne morreu em julho de 2016. Leonard a acompanhou quatro meses depois.
Disponível na Looke. Veja aqui.

SUPERMENSCH: THE LEGEND OF SHEP GORDON (Mike Myers, 2013)
Dirigido por Mike Myers, ator famoso pelo papel do detetive Austin Powers, “Supermencsh” é um divertidíssimo doc sobre Shep Gordon, lendário agente artístico norte-americano. Gordon conheceu todo mundo: vendeu ácido para Janis Joplin e Jim Morrison, trabalhou com Pink Floyd e Groucho Marx, namorou Sharon Stone e coelhinhas da “Playboy”. No início dos anos 1970, virou agente de Alice Cooper e ajudou o cantor a criar sua imagem teatral. Suas histórias de hedonismo, mulheres e excessos inspiraram cenas de filmes como “Quase Famosos”, de Cameron Crowe.
Disponível na Globoplay. Veja aqui.

OS DIÁRIOS ZEN DE GARRY SHANDLING (Judd Apatow, 2018)
O comediante Garry Shandling (1949-2016) nunca teve no Brasil a fama e o respeito que mereceu nos Estados Unidos. Shandling é considerado um humorista inovador, cujo trabalho buscou reinventar a forma de fazer comédia televisiva. Um dos grandes fãs de Shandling é o comediante Judd Apatow (“O Virgem de 40 anos”), que dirigiu e produziu esse documentário de mais de quatro horas, que a HBO exibe em duas partes. A lista de entrevistados dá uma ideia da moral que Shandling tinha entre os colegas comediantes: Jim Carrey, Jerry Seinfeld, Sarah Silverman, Jay Leno e Sacha Baron Cohen, entre muitos outros.
Disponível na HBO Go. Veja aqui.

O BARATO DE IACANGA (Thiago Mattar, 2019)
Numa época de megashows corporativos como Lollapaloozas e Rock in Rios, vale lembrar que o Brasil teve seu Woodstock: numa fazenda em Iacanga, interior de São Paulo, um maluco chamado Antonio Checchin Junior, o Leivinha, realizou, entre 1975 e 1984, quatro edições de um evento independente que marcou época: o Festival de Águas Claras. Esse doc, vencedor do festival In-Edit de 2019, conta a história do festival, de seus realizadores, e o impacto que ele teve na vida dos moradores da pacata Iacanga. Destaque para as ótimas histórias envolvendo o misantropo João Gilberto.
Disponível na Netflix. Veja aqui.

ADEUS, PASV, FOI BOM TE CONHECER

Mais um cliente satisfeito saindo do PASV…

A pandemia não mata só pessoas, mata cidades também. E um pedaço de São Paulo foi embora junto com o PASV, um botecão espanhol que estava há meio século na Avenida São João, perto do Largo do Arouche.

Alguns restaurantes antigos fecham porque não conseguem manter a qualidade. Não era o caso do PASV. Fui pela última vez no fim do ano passado, e a comida era tão boa quanto na primeira vez que entrei lá, trinta anos atrás.

O único pecado do PASV é que os donos tinham muito mais habilidade manejando a grelha do que o Instagram.

Comer lá era o mais próximo de um almoço na casa da vovó. Havia a Dona Maria, vovó de todos, sempre preocupada com nosso bem estar: “Filhinho, você está com uma aparência cansada, não quer mais um pouquinho de purê de batata?”

Meu amigo Paulo Cesar Martin, com quem dividi incontáveis mesas por lá, escreveu um texto lindão sobre o PASV e a necessidade de frequentar lugares como aquele. Leia aqui.

Ao seu Pepe e seu Ramon, ao pessoal da cozinha e do balcão, um beijo e um agradecimento de coração.

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Uma ótima semana a todos.

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Moraes Moreira e os Novos Baianos ajudaram a inventar o pop brasileiro http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2020/04/13/moraes-moreira-e-os-novos-baianos-ajudaram-a-inventar-o-pop-brasileiro/ http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2020/04/13/moraes-moreira-e-os-novos-baianos-ajudaram-a-inventar-o-pop-brasileiro/#respond Mon, 13 Apr 2020 17:13:50 +0000 http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/?p=2995
A maneira mais sucinta e correta de descrever a importância dos Novos Baianos para o pop brasileiro é lembrar que, antes do grupo, o pop brasileiro praticamente não existia. E o que existia não era popular.

É fato que a Jovem Guarda fez sucesso comercial alguns anos antes, mas foi um fenômeno importado, que traduziu em português uma sonoridade vinda da Europa e dos Estados Unidos. Os Mutantes foram a primeira explosão de uma música pop autenticamente brasileira, mas hoje é fácil esquecer como o grupo era desconhecido na época. O público simplesmente não comprava seus discos.

Já a geração de Novos Baianos e outros gênios musicais, como Raul Seixas e Secos e Molhados, inventou, no início da década de 70, uma música pop verdadeiramente brasileira e popular, que abarcava influências externas enquanto promovia sua fusão com ritmos como baião, samba, xaxado e choro.

“Acabou Chorare” (1972), o segundo disco dos Novos Baianos, é uma espécie de marco zero dessa geração. Lançado um ano antes dos LPs de estreia de Raul Seixas e Secos e Molhados, misturava Hendrix e Assis Valente, Beatles e João Gilberto, Santana e Jacob do Bandolim.

O disco ajudou a quebrar uma barreira que existia entre a MPB cabeça, universitária e de protesto de Chico, Vandré e outros, e a música pop, considerada som de alienados e entreguistas (vale lembrar que, cinco anos, antes, Gilberto Gil e Elis Regina marcharam em São Paulo contra a guitarra elétrica, considerada símbolo de nossa submissão cultural).

E aqui estava um bando de baianos malucos e chapados, músicos e letristas excepcionais, mostrando que era possível fazer um disco que abria com um samba-exaltação de Assis Valente dos anos 1940 (“Brasil Pandeiro”) para logo em seguida emendar numa modinha composta por Moraes Moreira e Galvão e decorada por um lindo solo de bandolim de Pepeu Gomes (“Preta Pretinha”) e num acid-jazz-rock à Santana (“Tinindo Trincando”). Valia de tudo.

Outra lembrança importante: esses disco tão eclético e doido foi lançado pela Som Livre, braço fonográfico da TV Globo, o que mostra como as grandes gravadoras da época, comandadas por executivos como João Araújo e André Midani (Philips), que amavam música e respeitavam artistas, eram corajosas em suas escolhas artísticas.

Quando os Novos Baianos saíram da RGE, onde haviam gravado seu primeiro LP, “Ferro na Boneca” (1970), disseram para João Araújo, chefe da Som Livre (e pai de Cazuza), que só assinariam com o selo se tivessem total liberdade criativa. “João disse que podíamos gravar o que a gente quisesse, que ninguém ia meter a mão em nada”, disse Pepeu Gomes. “E ele cumpriu a promessa”. O resultado foi “Acabou Chorare”.

Se Moraes Moreira tivesse encerrado a carreira depois de “Acabou Chorare”, já teria garantido seu lugar na história da música brasileira. Mas ele fez muito mais: eletrificou o carnaval com “Pombo Correio” e “Festa do Interior”, ajudou a popularizar o frevo, e lançou cerca de 35 discos que sempre reverenciaram a música brasileira de raiz.

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Merecia o Guinness? Banda brasileira pode ter gravado 50 mil músicas http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2020/04/07/merecia-o-guinness-banda-brasileira-pode-ter-gravado-50-mil-musicas/ http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2020/04/07/merecia-o-guinness-banda-brasileira-pode-ter-gravado-50-mil-musicas/#respond Tue, 07 Apr 2020 09:00:58 +0000 http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/?p=2963

Os Carbonos no estúdio: Mario, Raul, Igor Edmundo, Beto e Ricardo Fernandes de Morais


Em 1974, o Livro Guinness dos Recordes cravou a cantora indiana Mangheshkar Bhosle como a detentora da marca de maior número de músicas gravadas, com 25 mil canções. O título foi revisto em 2011, quando o Guinness, depois de reclamações por parte de pesquisadores, mudou sua decisão e apontou a irmã de Mangeshkar, a cantora Asha Bhosle, como a nova recordista, com 11 mil músicas gravadas. O que o Guinness não sabe é que num estúdio da Vila Mariana, em São Paulo, ainda trabalham três irmãos – Mário, Beto e Raul Carezzato – que certamente gravaram mais de 11 mil canções. Num cálculo possível, podem ter chegado a 50 mil músicas.

Desde meados dos anos 1960, os Carezzato formaram, com outros integrantes, o grupo de estúdio mais atuante do pop brasileiro: Os Carbonos.

Escrevi sobre Os Carbonos no livro “Pavões Misteriosos” (2014):

O grande público não conhece Os Carbonos, mas muita gente sabe cantar os hits do pop brasileiro que eles gravaram, como músicos de estúdio: “Feelings” (Morris Albert), “Summer Holiday” (Terry Winter), “Domingo feliz” (Ângelo Máximo), “Aquela nuvem” (Gilliard), “Flying” (Jessé), “Fuscão preto” (Almir Rogério), “Aonde a vaca vai o boi vai atrás” (João da Praia), “É o amor” (Zezé Di Camargo e Luciano), além de dezenas de LPs de Melindrosas, Harmony Cats, Bartô Galeno, Trio Parada Dura, Amado Batista, Carlos Alexandre, Los Maneros, Tony Damito, Marcos Roberto, Chrystian e Ralf e dez LPs de Paulo Sérgio, o maior rival de Roberto Carlos. Somando tudo, os Carbonos são uma das bandas que mais venderam discos no Brasil.

De meados dos anos 1960 ao fim dos anos 1980, eles foram o grupo de estúdio mais atuante de São Paulo, gravando por diversos selos: RGE, Top Tape, AMC, Beverly, Copacabana, Continental, Mocambo, Som Livre e Chantecler. Além do trabalho com outros artistas, lançaram cerca de quarenta LPs próprios, entre discos de covers, músicas italianas, rock, samba, sertanejo e forró. Também gravaram jingles famosos, como “Toddy, sabor que alimenta” e o inesquecível comercial da dedetizadora d.d.drin (“A pulguinha dançando iê-iê-iê, o pernilongo mordendo o meu nenê”).

Calcular com exatidão o número de músicas gravadas pelos Carbonos é impossível. O ritmo de trabalho era tão insano que eles não se preocuparam em documentar as sessões de que participaram. Em um dia normal, gravavam a base – guitarra, bateria, teclados e baixo – de pelo menos um LP inteiro, com dez ou doze faixas (essas gravações eram posteriormente finalizadas pelos produtores e arranjadores, que gravavam os vocais dos intérpretes e adicionavam, se necessário, naipes de cordas ou metais. Assim, na maioria das vezes, Os Carbonos nem chegavam a encontrar os artistas que assinavam os discos que eles gravaram).

Os Carbonos praticamente moravam em estúdios. Varavam noites gravando, em sessões de seis horas, e dormiam em sofás ou colchões no chão do estúdio. Trabalhavam de segunda a sábado. Um cálculo possível – dez músicas por dia, cinco dias por semana, durante vinte anos – daria um total de mais de 50 mil músicas. Só para comparar, o lendário baterista Hal Blaine, um dos músicos de estúdio mais prolíficos e celebrados dos Estados Unidos, que tocou com Elvis Presley, Beach Boys, Simon & Garfunkel e The Supremes, calcula ter gravado 35 mil músicas em quatro décadas de carreira.

A base dos Carbonos são os irmãos Mário, Beto e Raul Carezzato. Beto e Raul nasceram em 1946 e são gêmeos não idênticos. Mário é cinco anos mais velho. A família, de origem italiana, tem uma longa história na música. Os tios dos rapazes eram Os Trigêmeos Vocalistas, grupo vocal que fizera sucesso nos anos 1930 e 1940 cantando no Cassino da Urca e na Rádio Nacional (assim como os Carbonos, os Trigêmeos Vocalistas eram formados por dois gêmeos e o irmão mais velho).

Os Carbonos em 2019: Mário, Raul e Beto Carezzato

No início dos anos 1960, quando os Carezzato viviam no bairro Santa Cecília, em São Paulo, os gêmeos Beto e Raul começaram a se interessar por rock. Mário só queria saber de música clássica: formou-se em piano, canto, regência de coral e orquestração e chegou a excursionar pela Europa como barítono do Madrigal da Orquestra de Câmara de São Paulo.

Beto e Raul se juntaram aos amigos “Ricardão” Fernandes de Morais (guitarra) e Igor Edmundo (baixo e guitarra) – um guatemalteco que vivia no Brasil – e, com o nome de Os Quentes, gravaram o primeiro compacto. Logo depois, o baterista Antônio Carlos de Abreu, irmão do autor de novelas Sílvio de Abreu, entrou no grupo, e Mário, o irmão mais velho, assumiu os teclados. Os Quentes foram tocar na boate do hotel Danúbio, na avenida Brigadeiro Luís Antônio, em uma época em que lá se hospedava um grupo de americanos da Força Aérea que faziam levantamentos topográficos no Brasil. Para agradar aos hóspedes, o grupo tocava rock em inglês e também músicas de grupos instrumentais, como The Shadows e The Ventures. Os americanos adoravam.

Impressionada com a qualidade técnica dos rapazes, a gravadora Beverly encomendou um LP de covers com sucessos do momento. Os Quentes gravaram “A praça” (Ronnie Von), “Só vou gostar de quem gosta de mim” (Roberto Carlos), “Coração de papel” (Sérgio Reis) e “Vem quente que eu estou fervendo” (Erasmo Carlos), além de hits internacionais como “With a Girl Like You” (The Troggs) e “Black Is Black” (Los Bravos). Um dia, Beto e Raul andavam pelo centro de São Paulo quando viram vários cartazes anunciando o disco, mas com o nome de outro conjunto: Os Carbonos. A Beverly havia rebatizado o grupo e nem os avisara. O nome, contudo, era perfeito: ninguém copiava músicas com tanta competência quanto eles.

O disco foi o primeiro de uma série, chamada As 12 mais da juventude. Os Carbonos gravaram Beatles (“Ob-la-di, ob-la-da”), Jorge Ben (“Ela é minha menina”), Otis Redding (“Sittin’ on, the Dock of the Bay”), Roberto Carlos (“É meu, é meu, é meu”), Procol Harum (“A Whiter Shade of Pale”) e muitos outros nomes de sucesso. Às vezes, o conjunto fazia versões antes que as músicas originais chegassem às lojas. Raul conta que os produtores subornavam os funcionários de outras gravadoras para mostrar ao grupo os acetatos (discos “modelo”, que serviam de base para a prensagem de LPs) de futuros lançamentos. Os Carbonos decoravam as músicas e corriam para gravá-las no estúdio. A Beverly logo percebeu que o talento dos rapazes não se limitava ao rock e transformou Mário Carezzato no cantor “italiano” Mario Bruno, que gravou a série de discos As 12 mais italianas, com hits da música pop da terra de Rita Pavone.

Ano passado, o programa “Conversa com Bial” homenageou Os Carbonos. Assista aqui.

Os Carbonos chegaram a tocar com Roberto Carlos no programa de TV Jovem Guarda e se firmaram como uma das melhores bandas de baile do país, fazendo longas excursões pelo Norte e Nordeste. Um de seus grandes sucessos foi a série Supererótica, lançada em 1970 com o pseudônimo de Magnetic Sounds, que trazia canções de temas “adultos” como “Doin’ It”, de Ike Turner, e “Je t’aime, moi non plus”, de Serge Gainsbourg. Os gemidos de Jane Birkin foram gravados, na versão brasileira, pela cantora Norma Aguiar, irmã de Nalva Aguiar. Os discos chegavam às lojas com uma tarja que dizia: “Censura 18 anos”, além de um texto alertando que a radiofusão e execução das músicas estavam proibidas em locais públicos. Foi um estouro de vendas.

Os rapazes, entretanto, logo cansaram da vida na estrada e passaram a se concentrar no trabalho em estúdios. Em pouco tempo, viraram o conjunto mais procurado por gravadoras e artistas. Além de o grupo tocar em incontáveis discos, os músicos participaram, individualmente, de outros tantos: Raul fez vocais de apoio – junto com Antonio Marcos – em “Aleluia (Che Guevara não morreu)”, de Sérgio Ricardo, e “Moça”, de Wando, e percussão em “Entre tapas e beijos” (Leandro e Leonardo) e “Comer, comer” (Genghis Khan). Beto tocou baixo em inúmeros discos de Odair José e César Sampaio.

O trabalho no estúdio era extenuante, e o ritmo das gravações, acelerado. Os integrantes dos Carbonos liam partituras, gravavam rapidamente e quase nunca erravam. Muitas vezes, nem sabiam o que estavam gravando. “Os maestros e arranjadores chegavam com as partituras, a gente dava uma olhada e gravava, sempre de primeira”, conta Beto. Um dia, o maestro Rogério Duprat, responsável por alguns dos principais arranjos da Tropicália, chegou ao estúdio acompanhado de Jorge Ben e Gal Costa. Duprat disse que queria gravar uma música, mas não tinha partitura. Ele pediu a Beto e Raul que prestassem atenção no violão de Jorge Ben e o acompanhassem. Beto tocou baixo e Raul, percussão. Meses depois, quando ouvia rádio, uma música chamou a atenção de Beto. Era uma canção bonita, suingada, com arranjo lindo e vocais de Gal e Caetano Veloso. Era “Que pena” (do disco Gal Costa, de 1969). “Eu imediatamente reconheci o baixo e a percussão. Fomos nós que gravamos.”

Músicos de estúdio raramente recebiam créditos nos discos. Raul diz que se arrepende de ter sido tão relapso com isso: “Queríamos receber pela tabela do sindicato e não nos preocupávamos com os direitos. Hoje, sabemos que isso nos prejudicou”.

Prejudicou financeiramente e causou uma injustiça histórica. Porque se os Carbonos tivessem a prova de que tocaram em tantos discos, hoje poderiam estar no Guinness.

Para quem quiser conhecer mais sobre os Carbonos, o quarto episódio de minha série “História Secreta do Pop Brasileiro”, disponível nas plataformas Now, Vivo e Looke, é sobre a banda.

MORREU O MAIOR ESCRITOR QUE QUASE NINGUÉM CONHECE

Charles Portis com John Wayne no set de “Bravura Indômita” (1969)

Passou quase despercebida nos EUA – e completamente despercebida por aqui – a morte, em 17 de fevereiro, aos 86 anos, do escritor Charles Portis.

Portis não era muito conhecido do grande público. Seu único sucesso comercial veio em 1968, com o romance “True Grit” (“Bravura Indômita”), adaptado duas vezes para o cinema, uma em 1969, num filme que deu a John Wayne o único Oscar de sua carreira, e outra em 2010 pelos Irmãos Coen, com Jeff Bridges no papel que fora de Wayne.

Portis era um recluso excêntrico que, em 1964, aos 31 anos, abandonou uma promissora carreira de jornalista em Nova York para pescar e escrever no interior do Arkansas. Nesses 56 anos, não deu entrevistas e lançou apenas cinco romances: “Norwood” (1966), “True Grit” (1968), “The Dog of the South” (1979), “Masters of Atlantis” (1985) e “Gringos” (1991), além de uma coletânea de artigos, “Escape Velocity: A Charles Portis Miscellany” (2012).

Nos sites de livros usados achei apenas dois livros em português: “Bravura Indômita” (também chamado “Olho por Olho”) e “O Cão do Sul”. Leia os dois e não se arrependerá. Se você lê em inglês, sugiro comprar todos. Os livros são curtos (250/300 páginas), engraçadíssimos e viciantes.

Até o fim do ano passado, eu só havia lido “True Grit”, mas não sou grande fã de faroestes e confesso que não tinha me empolgado tanto. Mas um artigo num jornal me fez ler “O Cão do Sul”, e fiquei absolutamente obcecado pelo cara.

Portis tem um estilo sardônico e um peculiar gosto pela estranheza. Seus personagens são criaturas que vivem à margem do sistema e frequentam festas estranhas de gente esquisita. “O Cão do Sul” é sobre um sujeito que vai ao México atrás da esposa, que fugiu com um de seus melhores amigos. “Gringos” fala de um aventureiro que vive na fronteira entre o México e a Guatemala e se vê envolvido com um culto apocalíptico que sacrifica vidas humanas. E o mais bizarro dos livros de Portis, “Masters of Atlantis”, conta a saga de um homem envolvido com uma sociedade secreta que investiga a localização da cidade perdida de Atlântida.

Se você gosta de Pynchon, DeLillo e Bolaño, tem tudo para virar fã de Charles Portis.

Uma ótima semana a todos.

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MUBI exibe filme clássico que inspirou “Parasita” http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2020/03/31/mubi-exibe-filme-classico-que-inspirou-parasita/ http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2020/03/31/mubi-exibe-filme-classico-que-inspirou-parasita/#respond Tue, 31 Mar 2020 09:00:58 +0000 http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/?p=2949

Para quem chegou agora, um aviso: este blog não tem “conteúdo patrocinado”.

Isso quer dizer que as dicas de filmes, discos e livros que o leitor encontra aqui não são motivadas por nenhum interesse pecuniário. Acho importante deixar isso claro, especialmente nesses tempos de Youtubers e influencers, em que o leitor não consegue mais diferenciar jornalismo de jabá.

Esclarecido esse ponto importante, gostaria de recomendar o MUBI, um serviço de filmes sob demanda especializado em cinema de arte. O MUBI custa vinte e poucos mangos por mês e tem uma seleção extraordinária. Cada dia entra um filme novo, que fica disponível por 30 dias. Ou seja: a qualquer hora que você acessa, há 30 títulos disponíveis, de clássicos antigos a produções novas de toda parte do mundo. E tudo com legendas em português.

Hoje você pode ver filmes recentes do Irã, Romênia, Espanha, Japão, Bélgica, Gana e Brasil (“O Som ao Redor”, de Kleber Mendonça Filho, e “Maria”, um documentário sobre a escultora brasileira Maria Martins, dirigido por Elisa Gomes e Francisco C. Martins), além de clássicos dos franceses Louis Malle (“Trinta Anos Essa Noite”) e Robert Bresson (“Diário de um Pároco de Aldeia”), do norte-americano King Vidor (“O Pão Nosso”) e do japonês Yuzo Kawashima (“Duas Almas e um Destino”).

Esses dias, o grande destaque da programação é uma série dedicada ao cineasta norte-americano Joseph Losey (1909-1984), com quatro filmes que ele dirigiu em seu exílio europeu, depois que deixou os Estados Unidos em 1953 pela perseguição que sofreu da temida HUAC, uma comissão de deputados que investigava pessoas supostamente envolvidas em atividades “subversivas” e ligações comunistas.

Os filmes são “Eva” (1962), “Cidadão Klein” (1976), “O Criado” (1963) e “Estranho Acidente” (1967), os dois últimos com roteiros do dramaturgo inglês Harold Pinter, vencedor do Nobel de Literatura.

Os três filmes são excelentes, mas “O Criado” periga ser o melhor filme de Losey e um dos mais perturbadores dramas psicossexuais do cinema, além de ter inspirado um filmaço recente – “Parasita”, do sul-coreano Bong Joon Ho. Nesse artigo, Joon Ho fala de cinco filmes que inspiraram “Parasita”.

Em “O Criado”, James Fox (“Performance”, “Vestígios do Dia”) faz Tony, um jovem playboy milionário que compra uma casa imensa e contrata um mordomo, Hugo Barrett (o genial Dirk Bogarde) para cuidar da residência.

No início, tudo vai bem: Hugo é um funcionário exemplar, e Tony está felicíssimo com seu trabalho. Mas a noiva de Tony, a aristocrática Susan (Wendy Craig) tem um pressentimento ruim sobre Hugo. A desconfiança de Wendy se confirma quando Hugo traz para a casa a irmã, Vera (Sarah Miles), e convence Tony a contratá-la como arrumadeira.

Vou parar por aqui para não dar nenhum “spoiler”, mas as semelhanças com “Parasita” são evidentes: uma família de trambiqueiros invade a mansão de um ricaço e transforma sua vida idílica de luxo e sofisticação em um pesadelo.

A forma como Losey mostra a crescente degeneração da relação entre Tony e Hugo é brilhante. No início do filme, a casa é fotografada como um oásis de tranquilidade: a luz é tênue e os espaços, amplos. Quando Hugo passa a controlar o ambiente – e, por consequência, a mente de Tony – Losey e seu fotógrafo, o grande Douglas Slocombe (que depois faria os três primeiros filmes de Indiana Jones) passam a usar lentes grandes angulares, que distorcem o ambiente e o transformam num cenário Expressionista, tornado ainda mais grotesco por uma iluminação forte e altamente contrastada, dando à segunda metade do filme um efeito de enclausuramento e paranoia.

James Fox, Joseph Losey e Harold Pinter no set de “O Criado”

O roteiro de Harold Pinter, adaptado de um romance do britânico Robin Maugham, consegue falar de temas complexos – guerra de classes, repressão sexual, a falácia da tese de superioridade moral das classes economicamente desfavorecidas – de forma concisa. O filme tem, basicamente, dois ou três cenários e quatro atores. O elenco inteiro, incluindo figurantes – entre eles, o próprio Harold Pinter – não passa de 15 pessoas.

Enfim, aqui está um filme feito há 57 anos e que se mantém tão atual que inspirou Bong Joon Ho a fazer um dos grandes filmes de 2019.

DOIS DISCOS: “THE TONY BENNETT / BILL EVANS ALBUM” (1975) e “TOGETHER AGAIN” (1977)
Para esses dias de angústia, poucos discos trazem tanto conforto e placidez quanto essas colaborações entre o cantor Tony Bennett e o pianista de jazz Bill Evans.

ADEUS A GIGANTES DO JAZZ E DO SOM INDUSTRIAL

MANU DIBANGO
O saxofonista e vibrafonista camaronês Manu Dibango morreu em 24 de março, aos 86 anos, vítima do Coronavírus. Dibango foi um dos grandes nomes da música africana e influenciou artistas do pop, funk e disco com sua empolgante mistura de jazz e ritmos africanos. Até Michael Jackson “se inspirou” – eufemismo para “plagiou” – Dibango na faixa “Wanna Be Startin’ Somethin’”, que abria o álbum “thriller”. Jackson admitiu ter copiado o refrão da música “Soul Makossa” (1972) e pagou uma merecida indenização ao camaronês. Aqui está Dibango ao vivo em uma apresentação no ano passado, ainda em plena atividade.

GENESIS P-ORRIDGE
O(a) músico(a), poeta, ocultista, antagonista de todo e qualquer sistema e defensor(a) de toda e qualquer liberdade individual, morreu de leucemia em 14 de março, aos 70 anos. Genesis fundou grupos seminais do som industrial, como Throbbing Gristle e Psychic TV, que influenciaram de Ministry a Nine Inch Nails, passando pelo techno experimental e a música eletrônica de vanguarda. Aqui está Gensesis e o Psychic TV com “Godstar”, homenagem a Brian Jones, o mais trágico dos Stones:

E aqui, Genesis e o Throbbing Gristle desvirtuando a juventude em 1981, ao vivo em São Francisco:

BILL RIEFLIN
Antes de tocar no REM e no King Crimson, Bill Rieflin, que morreu de câncer em 24 de março, aos 59 anos, foi baterista de alguns dos maiores grupos de som industrial, como Ministry, KMFDM, Swans, Pigface, Lard e Revolting Cocks. Aqui está ele com o Ministry em 1990, tocando “Breathe” (o outro baterista, o louro de cabelo espetado, é Martin Atkins). Tive a sorte de ver o Ministry nessa época, um dos melhores shows que já assisti. Rieflin foi um grande baterista e tocou em muitos discos fundamentais.

Uma ótima semana a todos.

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“Chinatown” marcou o fim de uma era em Hollywood http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2020/03/24/chinatown-marcou-o-fim-de-uma-era-em-hollywood/ http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2020/03/24/chinatown-marcou-o-fim-de-uma-era-em-hollywood/#respond Tue, 24 Mar 2020 09:00:04 +0000 http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/?p=2935 Pode parecer desimportante e supérfluo retomar um blog na época apocalíptica que estamos vivendo, mas acho fundamental tentar manter um mínimo de “normalidade” em meio ao caos. Assim, decidi recomeçar a escrever – toda terça-feira – este blog, depois de 15 meses parado.

Nesse período, trabalhei em três projetos de séries de TV. Duas ainda não estrearam, mas uma delas, a série documental “História Secreta do Pop Brasileiro”, está disponível nas plataformas Now, Looke e Vivo Play. Espero que gostem. E obrigado ao colega Mauricio Stycer por esse texto tão bacana sobre a série.

CHINATOWN: UM GRANDE LIVRO SOBRE UM GRANDE FILME

Acaba de sair – por enquanto só no exterior – um livro fundamental para quem admira o cinema norte-americano dos anos 1970: “The Big Goodbye: Chinatown and the Last Years of Hollywood”, de Sam Wasson.

Wasson, autor de livros sobre Audrey Hepburn, Paul Mazursky e Bob Fosse, conta os bastidores da produção de “Chinatown” (1974), o clássico “noir” de Roman Polanski, e levanta uma teoria interessante: a de que o filme marcou o fim de uma era de ouro em Hollywood.

Foi bem naquele período, o meio dos anos 1970, que os grandes estúdios hollywoodianos começaram a ser controlados por executivos vindos de outras áreas, como a televisão e até mesmo a indústria farmacêutica. Muitos desses executivos não sabiam nada de cinema e não estavam interessados na história de Hollywood. O que sabiam era ganhar dinheiro.

Assim, pouco a pouco, Hollywood foi deixando de lado executivos “old school”, que aprovavam filmes e roteiros usando a intuição e décadas de convívio com cineastas, produtores e roteiristas, e passou a utilizar métodos mais “profissionais”, como testes com público e campanhas milionárias de lançamentos de filmes.

Em 1975, veio “Tubarão”, de Steven Spielberg, um dos primeiros “blockbusters” lançados com esses critérios. O filme foi um fenômeno de bilheteria e marcou a virada para uma era de filmes cada vez mais comerciais e apelativos, deixando para trás a Hollywood que produziu alguns dos maiores clássicos do cinema norte-americano, como “O Poderoso Chefão” (Francis Ford Coppola), “Taxi Driver” (Martin Scorsese), “A Última Sessão de Cinema” (Peter Bogdanovich), “Meu Ódio Será Tua Herança” (Sam Peckinpah), “Um Dia de Cão” e “Serpico” (Sidney Lumet) e muitos outros.

No livro, Wasson traça perfis detalhados e reveladores dos talentos que fizeram “Chinatown”, como o cineasta Roman Polanski, o produtor Robert Evans, o roteirista Robert Towne e os atores Jack Nicholson e Faye Dunaway.

É fascinante ler sobre as brigas entre Polanski e Towne. Eu nunca soube, por exemplo, que o roteiro de “Chinatown”, que deu o Oscar a Towne, havia sido tão modificado por Polanski. O cineasta franco-polonês abominava a versão original, que considerava piegas, e mudou muita coisa, incluindo o final, com a morte da personagem de Faye Dunaway e o triunfo do vilão da história, Noah Cross, interpretado pelo cineasta John Huston (que só aceitou o emprego de ator para pagar dívidas de jogo). A versão de Towne era bem mais “otimista”.

Quando escreveu “Chinatown”, Robert Towne era um roteirista de TV que havia assinado apenas um filme mais conhecido (mas que filme: “The Last Detail”, de Hal Ashby!) e colaborado em obras de amigos, muitas vezes sem receber créditos, como “Bonnie e Clyde”, de Arthur Penn, “The Parallax View”, de Alan J. Pakula e, mais famosamente, na antológica cena entre Vito Corleone (Marlon Brando) e Michael (Al Pacino) em “O Poderoso Chefão”. Francis Ford Coppola não gostava da cena que ele próprio havia escrito e ligou em desespero para Towne dizendo que, se não melhorasse aqueles diálogos, corria o risco de perder Marlon Brando. Towne voou para Nova York, conversou com Coppola, Brando e Pacino, trancou-se no hotel e escreveu até quatro e meia da manhã. No dia seguinte, levou as páginas para o set. O resultado foi isso:

Para Robert Towne, “Chinatown” era mais que um emprego. Era o filme que ele havia nascido para escrever. Towne crescera na mesma Los Angeles retratada em “Chinatown” e via o filme como um tributo a uma cidade romântica e lúdica que não existia mais, transformada – já em 1974 – num Frankenstein de freeways e lojas de fast food. Ele levou cerca de quatro anos lapidando o roteiro, só para vê-lo retalhado por Polanski.

“Chinatown” fez de Towne um dos roteiristas mais importantes de Hollywood, mas o sucesso também arruinou sua vida pessoal. Com a riqueza, ele se isolou em uma mansão, começou a cheirar quantidades cavalares de cocaína e destruiu sua família.

Um dos personagens mais interessantes – e até então desconhecidos – do livro é Edward Taylor, um amigo de Towne que foi, durante muitos anos, seu braço direito na escrita de roteiros. Taylor não se importava com fama ou dinheiro. Tudo que queria era passar os dias trancado em casa – ou melhor, na casa de Towne, onde vivia – lendo romances policiais. Towne pagava um salário a Taylor para ajudá-lo nos roteiros, e não foram poucas as contribuições de Taylor para o roteiro de “Chinatown”.

Polanski dirige Faye Dunaway e Jack Nicholson

E que sujeito intrigante é Jack Nicholson: fã dos Existencialistas e da literatura beat norte-americana, chegou em Hollywood sem um centavo, viveu por anos às custas de amigos como os cineastas Roger Corman e Monte Hellman e, assim que se tornou um astro, fez o mesmo por vários outros camaradas, trabalhando de graça ou por percentual de bilheteria para ajudar filmes em que acreditava.

Wasson conta que a casa de Nicholson era uma festa ininterrupta, um entra-e-sai de artistas, cineastas e músicos. Havia, como prova de amizade, uma caixa de dinheiro na sala, que qualquer um podia pegar para suprir “necessidades básicas”.

Nicholson amava o cinema e a época de ouro de Hollywood com a mesma intensidade com que odiava a televisão. Nunca fez uma entrevista em talk shows e via a TV, já em 1974, como um inimigo do cinema. “Sempre fui atraído por pessoas mais velhas e que já estavam em Hollywood quando cheguei, como Sam Spiegel e Billy Wilder. Eu tive a sorte de aparecer em uma época em que eles ainda estavam por aqui e conversei com alguns deles. Eles falavam bastante sobre a importância de ter classe. Isso era uma coisa muito importante para eles, e você não ouve muita gente falando sobre isso hoje em dia. O mundo vai sentir falta da experiência de ir ao cinema.”

No livro, Wasson conta histórias impressionantes sobre o talento e perfeccionismo de Roman Polanski. Membros da equipe técnica do filme relatam que o polonês dominava completamente a arte cinematográfica, a ponto de discutir detalhes técnicos de equipamentos com editores, iluminadores e com o fotógrafo John A. Alonzo (chamado às pressas depois que Polanski demitiu o genial Stanley Cortez, que havia fotografado clássicos como “Soberba”, de Orson Welles, e “O Mensageiro do Diabo”, de Charles Laughton, por não ter gostado do que viu nos primeiros dias de filmagem: “O estilo de Cortez e seu uso de iluminação eram antiquados”, disse Polanski a Wasson).

Nenhuma cena do filme evidenciou a genialidade de Polanski mais que a derradeira, em que a personagem Evelyn Mulwray (Faye Dunaway) morre com um tiro numa rua de Chinatown. Polanski instruiu o fotógrafo Alonzo a filmar uma sequência complicadíssima, em que Alonzo teria de correr com a câmera na mão, em estilo documental, depois mostrar os policiais se aproximando do carro, virar a câmera e mostrar o cadáver de Evelyn, depois os gritos de sua filha e de Noah Cross, cortar para o detetive J.J. Gittes (Jack Nicholson) e policiais, depois subir de costas numa grua e ser suspenso nove metros no ar enquanto Gittes é levado e uma multidão se aproxima para ver a cena do crime.

Polanski fizera o filme inteiro com uma fotografia realista e evitando clichês do cinema “noir”, mas guardou para o fim a única tomada lúdica e verdadeiramente “hollywoodiana” de “Chinatown”. É um dos finais mais lindos da história do cinema.

UM PODCAST: MOJICA

Perdoem se a dica soa cabotina, mas o homenageado merece: junto com os amigos André Forastieri, Paulo César Martin e Álvaro Pereira Jr., gravei um podcast em homenagem ao grande José Mojica Marins, o Zé do Caixão, que nos deixou em fevereiro. O podcast traz histórias e lembranças desse grande cineasta e amigo, e tem participações de outras pessoas que conheceram Mojica de perto, como os cineastas Dennison Ramalho e Paulo Sacramento, os pesquisadores Carlos Primati e Marcelo Colaiacovo, e a estilista Paula Bertone. Ouçam aqui.

UMA MINISSÉRIE: “O PEQUENO QUIN QUIN”

O serviço sob demanda Looke oferece de graça essa obra-prima dirigida em 2014 pelo francês Bruno Dumont (“L’Humanité”, “Flandres”). Originalmente lançada no festival de Cannes como um longa-metragem de 206 minutos, foi exibida como uma minissérie de quatro episódios na TV francesa.

“Quin Quin” é uma história bizarra sobre uma série de crimes numa cidade costeira do norte da França. Poucas vezes vi um filme subverter tanto os manuais de roteiro e direção. Dumont criou sequências inteiras – uma missa, um show de talentos, uma parada com banda marcial – que não têm nenhuma função dramática na narrativa, mas que dizem muito sobre os personagens e a ambientação da história.

Acontece muito pouco em “Quin Quin”, mas todo fotograma é uma surpresa. Não deixe de ver.

Uma dica importante: na plataforma Looke, os dois primeiros episódios estão invertidos. Quem quiser ver na ordem precisa começar de 51 minutos, no episódio “A Besta Humana”, depois voltar ao início.

Uma ótima semana a todos.

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O blog vai dar um tempo http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2018/12/10/o-blog-vai-dar-um-tempo/ http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2018/12/10/o-blog-vai-dar-um-tempo/#respond Mon, 10 Dec 2018 08:59:55 +0000 http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/?p=2925
Amigos,

É com um misto de tristeza e alegria que informo que interromperei o blog até, no mínimo, o fim de 2019.

Tristeza porque é um trabalho que adoro fazer, e alegria porque estou dando um tempo no blog para embarcar em dois imensos projetos audiovisuais, que me tomarão pelo menos dez meses.

Gostaria de agradecer a todos os leitores. Tenho a sorte de atrair os leitores mais interessados e interessantes. Os comentários de vocês são questionadores e informativos, e essa troca tem sido imensamente enriquecedora. Quem diz que seção de comentários é um poço de ignorância e ressentimento nunca entrou aqui no blog.

Agradeço ao UOL e ao grande Diego Assis, Editor-chefe de Entretenimento do portal, por toda a ajuda e apoio.

O blog não terminará, até para que o arquivo de textos continue disponível. Responderei a comentários até dia 14 de dezembro.

Um grande abraço e um ótimo fim de ano a todos.

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Um Sonic Youth vem ao Brasil falar sobre o clássico “Daydream Nation” http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2018/12/05/um-sonic-youth-vem-ao-brasil-falar-sobre-o-classico-daydream-nation/ http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2018/12/05/um-sonic-youth-vem-ao-brasil-falar-sobre-o-classico-daydream-nation/#respond Wed, 05 Dec 2018 08:59:50 +0000 http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/?p=2921 Coincidência: escrevi outro dia sobre os 30 anos do lançamento do álbum “Daydream Nation”, do Sonic Youth (leia aqui), e esses dias soube que o ex-baterista da banda, Steve Shelley, vem ao Brasil para debates e exibições de filmes sobre o LP.

Shelley vem a São Paulo como parte da programação da Semana Internacional de Música (SIM SP). Serão duas sessões,, ambas no Cine Olido, seguidas de debates com Shelley e com o músico brasileiro Gustavo Riviera (Forgotten Boys/Riviera Gaz).

Além de cenas de arquivo da banda, trechos de dois filmes compõem a sessão comentada: “Put Blood in the Music” (1989), do diretor Charles Atlas, que fala sobre a sonoridade oitentista de Nova York, com foco especial em John Zorn e Sonic Youth, e “Daydream Nation”, do diretor Lance Bangs, que mostra cenas do show de 2007 em Glasgow, na Escócia, no qual o Sonic Youth tocou o álbum na íntegra.

Veja o Sonic Youth tocando “Silver Rocket” no filme-concerto “Daydream Nation”:

As sessões rolam sábado (8), às 19h, e domingo (9), às 18h, no Cine Olido (Av. São João, 473, Centro). E pode se preparar para encar uma fila: os eventos são gratuitos, com retirada de ingressos uma hora antes da sessão. Mas a espera valerá a pena. Não é qualquer dia que se pode ouvir Steve Shelley falando sobre um disco tão importante.

P.S.: Devido a um compromisso inesperado, não conseguirei escrever o texto de sexta. O blog volta segunda, dia 10. Um ótimo fim de semana a todos.

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Sai no Brasil a “Bíblia” do indie rock americano pré-Nirvana http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2018/12/03/sai-no-brasil-a-biblia-do-indie-rock-americano-pre-nirvana/ http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2018/12/03/sai-no-brasil-a-biblia-do-indie-rock-americano-pre-nirvana/#respond Mon, 03 Dec 2018 08:59:00 +0000 http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/?p=2906

Do Texas, surgiu o Butthole Surfers

Quando o Nirvana desbancou Michael Jackson das paradas de discos, em 1991, muita gente achou que a banda surgira do nada. O público em geral nunca tinha ouvido falar do Nirvana ou da pequena gravadora que a havia descoberto, a Sub Pop, de Seattle (noroeste dos Estados Unidos).

Mas o sucesso do Nirvana não aconteceu num vácuo. Pelo menos dez anos antes do lançamento do LP “Nevermind”, começou a ser formada nos Estados Unidos uma ampla rede de gravadoras, fanzines, casas de shows e rádios alternativas, que davam suporte a centenas, milhares de bandas.

Em 2001, o jornalista estadunidense Michael Azerrad lançou um livro importante para entender esse movimento e a história do rock alternativo norte-americano pré-Nirvana: “Our Band Could Be Your Life – Notes from the American Indie Underground 1981-1991”, que finalmente sai no Brasil, com o título de “Nossa Banda Podia Ser Sua Vida” (editora Powerline Books & Music). O livro sai oficialmente dia 6 de dezembro, mas já está rolando uma pré-venda.

“Nossa Banda Podia Ser Sua Vida” é dividido em 13 capítulos, contando as histórias de 13 bandas fundamentais:

– Black Flag
– The Minutemen
– Mission of Burma
– Minor Threat
– Hüsker Dü
– The Replacements
– Sonic Youth
– Butthole Surfers
– Big Black
– Dinosaur Jr.
– Fugazi
– Mudhoney
– Beat Happening

Azerrad é um dos principais jornalistas musicais dos Estados Unidos, com passagens por revistas como “Rolling Stone” e “Spin”, e autor de uma ótima biografia do Nirvana, “Come As You Are”.

O jornalista Michael Azerrad

Em “Nossa Banda Podia ser Sua Vida” – frase tirada de uma canção do The Minutemen – Azerrad faz um excelente trabalho jornalístico, contando a formação de cada banda e de suas respectivas cenas.

Ele viaja da costa leste do país, com Sonic Youth e Minor Threat, à oeste, com The Minutemen, Black Flag e Mudhoney, passando pelo meio-oeste, casa de Big Black, Hüsker Dü e Replacements,e pelo centro-sul, com os texanos do Butthole Surfers.

O Mission of Burma é desconhecido do grande público, mas influenciou Pixies, R.E.M. e muitos outros

A impressão é de que, no início dos anos 80, havia um movimento alternativo por todo o país. Foi um período de idealismo e empreendedorismo, quando jovens criaram gravadoras em garagens e começaram a fazer fanzines e programas de rádios, com o objetivo de divulgar a música que não viam na MTV e não ouviam nas grandes emissoras.

Azerrad diz que teve a ideia de fazer o livro ao assistir na TV a um documentário sobre a história do rock, em que a cronologia pulava do Talking Heads diretamente para o Nirvana, ignorando tudo que surgira entre o fim dos anos 70 e o início dos 90.

Este livro coloca bandas pioneiras e pouco conhecidas, como Mission of Burma e Big Black, em seus devidos lugares: como nomes cruciais de uma cena musical das mais ricas.

Azerrad virá ao Brasil para o lançamento e participa de dois eventos dentro do SIM SP (Semana Internacional de Música de São Paulo): no dia 6 de dezembro, às 13h30, no Centro Cultural São Paulo – Sala Paulo Emílio, faz um debate com Steve Shelley (Sonic Youth), Dago Donato e Raquel Francese, e no dia seguinte, às 18h, no Centro Cultural São Paulo – Jardim Sul, autografa o livro.

Não será a primeira vez que Azerrad vem ao Brasil. Em 2008, eu o trouxe para um festival que ajudei a produzir, e que teve shows de Melvins e The Hives. Azerrad participou de um debate com integrantes do Melvins, que brincaram com ele, reclamando da ausência da banda no livro. Azerrad se desculpou: “Vocês têm toda razão. Não colocar o Melvins foi um erro imperdoável”.

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Os melhores filmes de Roeg e Bertolucci, gigantes do cinema http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2018/11/30/os-melhores-filmes-de-roeg-e-bertolucci-gigantes-do-cinema/ http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/2018/11/30/os-melhores-filmes-de-roeg-e-bertolucci-gigantes-do-cinema/#respond Fri, 30 Nov 2018 08:59:08 +0000 http://blogdobarcinski.blogosfera.uol.com.br/?p=2884 Semaninha triste para o cinema: dia 23 morreu o cineasta britânico Nicolas Roeg, 90; três dias depois, morreu o italiano Bernardo Bertolucci, 77.

Aqui vai uma lista de meus cinco filmes prediletos de cada um deles (e antes que alguém reclame: não incluí “O Último Tango em Paris” porque acho que envelheceu mal demais).

Em ordem cronológica:

NICOLAS ROEG

Performance (1970)
Icônico e estranho filme de gângster passado em plena efervescência da “Swinging London”, em que James Fox (não “Jamie Foxx”, por favor) faz um meliante jurado de morte que se refugia na casa de um rockstar, vivido por Mick Jagger. Filmado em 1968, só foi lançado dois anos depois porque o estúdio ficou com medo da reação do público ao sexo e violência do filme.

Walkabout (1971)
Um homem sai de seu apartamento confortável numa cidade grande australiana e, sem razão aparente, leva os dois filhos para o meio do deserto e tanta matá-los. As crianças sobrevivem e são resgatadas por um menino aborígene, que tenta levá-las de volta à “civilização”. Um de meus filmes prediletos.

Inverno de Sangue em Veneza (1973)
Inspirado num conto de Daphne Du Maurier – cujas obras foram adaptadas por Hitchcock em “Rebecca” e “os Pássaros” – é um clássico do terror psicológico sobre um casal (Donald Sutherland e Julie Christie) que, em viagem de trabalho a Veneza, é assombrado por imagens e lembranças da filha, que morrera afogada num riacho.

Eureka (1983)
Gene Hackman faz um explorador dos anos 1920 que encontra, literalmente, uma montanha de ouro. Ele se torna o homem mais rico do mundo, mas se desespera quando a filha (a sensacional Theresa Russell) cai de amores por um misterioso oportunista, vivido por Rutger Hauer. O filme é um delírio lisérgico à Jodorowsky, com algumas das cenas mais bonitas que já vi num filme.

A Convenção das Bruxas (1990)
Verdadeiro clássico da “Sessão da Tarde”, esse filme infantil é baseado num romance divertidíssimo de Roald Dahl (autor de “A Fantástica Fábrica de Chocolate”) e conta a história de um menino que viaja com a avó para um hotel na Noruega, onde se depara com uma convenção de feiticeiras lideradas pela diabólica Anjelica Huston. Roeg e Dahl dividiam o gosto pelo macabro e o humor negro.

BERNARDO BERTOLUCCI

Antes da Revolução (1962)
Nos anos 60, uma geração de cineastas italianos retomou os tons políticos do neorrealismo, mas com uma visão mais poética e menos panfletária. Artistas como Pasolini, Olmi, Bellochio e Bertolucci criaram histórias de personagens perdidos em meio a conflitos geracionais, sociais, sexuais e políticos. “Antes da Revolução” é um dos grandes filmes daquela safra, uma história centrada na história de um estudante que desconfia que seu melhor amigo cometeu suicídio.

O Conformista (1970)

Jean-Louis Trintignant faz Marcello, um assassino de aluguel ligado à polícia fascista na década de 1930. Por meio de “flashbacks”, Bertolucci conta a história desse personagem, um homem incapaz de sentir culpa por seus crimes e que deixou sua humanidade perdida em algum canto da burocracia estatal. É um dos grandes filmes do cinema político italiano e traz uma cena antológica de assassinato numa floresta. De quebra, tem Stefania Sandrelli no elenco.

A Estratégia da Aranha (1970)
Um filme estranho e fascinante, baseado num conto de Borges, sobre um homem que volta à pequena cidade onde nasceu para tentar solucionar o mistério da morte do pai, que muitos consideram um herói anti-fascista.

O Último Imperador (1987)
Maior sucesso de crítica e público da carreira de Bertolucci, esse épico sobre a vida de Puyi, último imperador da China, ganhou nove Oscars e quatro Globos de Ouro. Destaque para a linda fotografia de Vittorio Storaro e a direção de arte.

Assédio (1998)
Pouca gente viu o último grande filme de Bertolucci, sobre um excêntrico pianista (David Thewlis) que se apaixona pela empregada (Thandie Newton), uma africana que fugiu para a Europa depois da prisão do marido, um ativista político.

Um maravilhoso fim de semana a todos.

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