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Ministro da Justiça ao povo do Rio: salve-se quem puder!

André Barcinski

31/10/2017 09h57

Que a situação do Estado do Rio de Janeiro é calamitosa não é novidade: desemprego crescente, comerciantes falindo, empresas quebrando, saúde e educação em frangalhos, e a violência atingindo níveis nunca vistos.

As declarações bombásticas do ministro da Justiça e Segurança Pública, Torquato Jardim, sobre a questão da segurança no Rio, reportadas com a competência habitual por meu colega Josias de Souza (leia aqui), traçam um panorama desolador da situação.

Escreve Josias:

"[O ministro] declara que o governador fluminense, Luiz Fernando Pezão, e o secretário de Segurança do Estado, Roberto Sá, não controlam a Polícia Militar. Para ele, o comando da PM no Rio decorre de 'acerto com deputado estadual e o crime organizado'. Mais: 'Comandantes de batalhão são sócios do crime organizado no Rio'".

O diagnóstico do ministro da Justiça e Segurança Pública é aterrador, mas igualmente apavorante é o seguinte parágrafo da coluna de Josias:

"Torquato diz acreditar que o socorro do governo federal ao Rio, envolvendo as Forças Armadas, a Força Nacional de Segurança, a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária, vai atenuar os problemas, Mas 'a virada da curva ficará para 2019, com outro presidente e outro governador. Com o atual governo do Rio não será possível'".

Em bom português, o ministro disse o seguinte: "Povo do Rio, segure as pontas até 2019, porque agora eu não posso fazer nada. A situação só vai melhorar quando o governo que me botou no mais alto cargo da Justiça e da Segurança Pública do país não estiver aqui. E mais: quando o governador Pezão, que foi apoiado na eleição de 2014 pelo presidente que me pôs no cargo, Michel Temer (então vice de Dilma), também não estiver mais aqui."

Fugir da raia não é novidade para o ministro Torquato Jardim: em setembro de 2017, em entrevista à Folha, ele foi perguntado se achava possível acabar com a corrupção. Sua resposta:

"Depende. A corrupção começa a acabar quando um pai ou a mãe tirar da cama o filho preguiçoso para ir à escola e mandá-lo para fazer prova, em vez de deixar o filhinho dormindo e pedir atestado médico para justificar a falta."

Ou seja: o fim da corrupção, segundo Jardim, não passa por um endurecimento de nossas leis, pela transparência nos negócios públicos ou por apoio governamental à polícia e ao Ministério Público, mas só vai acontecer de verdade quando estudantes vagabundos pararem de matar aula com a conivência dos pais.

Em qualquer país menos acostumado a escândalos, essa declaração do ministro da Justiça seria causa de demissão. As declarações feitas hoje na coluna de Josias de Souza também. Afinal, de que serve um ministro que culpa alunos preguiçosos pela corrupção e diz que a situação da segurança só vai melhorar quando ele não for mais ministro?

Um ótimo feriadão a todos.

Sobre o autor

André Barcinski é jornalista, roteirista e diretor de TV. É crítico de cinema e música da “Folha de S. Paulo”. Escreveu sete livros, incluindo “Barulho” (1992), vencedor do prêmio Jabuti de melhor reportagem. Roteirizou a série de TV “Zé do Caixão” (2015), do canal Space, e dirigiu o documentário “Maldito” (2001), sobre o cineasta José Mojica Marins, vencedor do Prêmio do Júri do Festival de Sundance (EUA). Em 2019, dirigiu a série documental “História Secreta do Pop Brasileiro”.

Sobre o blog

Música, cinema, livros, TV, e tudo que compõe o universo da cultura pop estará no blog, atualizado às terças-feiras.