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40 anos sem Elvis: o Rei em dez canções

André Barcinski

16/08/2017 05h59

Hoje é o 40o aniversário da morte de Elvis Presley. E alguém ainda tem dúvidas de que ele foi o artista mais importante da história do rock? Com a palavra, Bob Dylan:

"Quando ouvi Elvis pela primeira vez, soube que não iria trabalhar pra ninguém e que ninguém seria meu patrão."

Dylan não falava especificamente da música de Elvis, mas de sua atitude e do que sua figura representou. Elvis não inventou o rock, mas fez algo muito mais importante: ajudou a popularizar um gênero então marginalizado e mostrou para toda a geração de adolescentes do pós-guerra que existia uma música que falava diretamente a eles. Depois de Elvis, filhos não precisaram mais ouvir a música dos pais.

Alguns tentam diminuir a importância de Elvis, dizendo que ele se apropriou da música negra e ficou rico com ela. Vamos ver o que Little Richard tem a dizer sobre isso:

"Elvis foi um milagre de Deus, não há outra explicação. (…) Elvis foi um integrador, Elvis foi uma bênção. Eles não deixavam a música negra entrar, mas Elvis abriu as portas para a música negra."

Nos 40 anos de sua morte, Elvis certamente receberá muitas homenagens. Aqui vai a minha, com um top 10 pessoal das melhores músicas gravadas pelo Rei e os melhores momentos de cada música (atenção: as seleções de trechos foram feitas em cima das versões originais das canções, não dos vídeos selecionados para essa matéria).

Claro que escolher só dez músicas do catálogo de Elvis é impossível, e muita coisa boa ficou de fora. Se eu fizesse a lista daqui a alguns dias, possivelmente seria bem diferente. Hoje o Top 10 é esse, em ordem cronológica:


Baby Let's Play House (1955)


Uma das maiores canções da primeira fase do rock, com a misteriosa e insinuante linha de baixo de Bill Black, Elvis gaguejando em "Baby-ba-by-baby…" e uma letra de pura safadeza, que deve ter corado as boas meninas e os bons meninos das melhores famílias.
Melhor momento: o soluço de Elvis a 0:07, que mostrou que nem tudo precisava soar perfeito – e deu a cantores imperfeitos como Lux Interior e Joey Ramone uma razão pra viver.

Don't Be Cruel (1956)


Depois de 31 "takes", Elvis conseguiu o pop perfeito: sensual, alegre e dançante.
Melhor momento: o gemido de Elvis – "huuuummmm…."- a 0:47, injetando na canção uma sensação incrível de espontaneidade.

Fever (1960)


Muita gente gosta de Elvis pela alegria que transmitia quando cantava, especialmente em seus primeiros trabalhos. Mas sempre preferi o Elvis mais lúgubre. Em "Fever" – canção de 1956 que mereceu uma versão espetacular de Peggy Lee em 1958 (e outra do The Cramps em 1980) – o Rei está em seus momentos mais sombrios e misteriosos.
Melhor momento: Elvis cantando "Moon lights up the night" ("A Lua ilumina a noite") a 0:46 – e inaugurando o estilo gótico de crooners como Nick Cave e Leonard Cohen.

Something Blue (1962)


Simplesmente amo essa música, em que Elvis descreve a experiência dolorosa de ser padrinho de casamento da mulher que ama. O pianinho, com um tema meio infantil e alegre, faz um contraponto à melancolia da letra: "Sinto que devo sorrir / ao andar atrás de você no caminho do altar / sinto que estou rumando para a minha ruína".
Melhor momento: a 1:26, Elvis estica a palavra "doom" – "Dooooooom" ("condenação", "fim", "ruína"), realçando a tristeza da canção.

Suspicion (1962)


Ainda no início dos anos 1960, Elvis já ensaiava o estilo melodramático e exagerado que teria seu auge em sua fase Las Vegas. Esta é uma de suas grandes interpretações.
Melhor momento: a 0:44, Elvis estufa o peito e manda um "Suspicion!" que quebra a placidez da canção. Lindo.

Guitar Man (1967)


Poucos cantavam rock como Elvis, e a prova é "Guitar Man", em que ele encarna um guitarrista que vaga pelos Estados Unidos sem conseguir emprego e sendo escorraçado de todos os lugares.
Melhor momento: a 0:55, Elvis conta como era enxotado: "Aqui não precisamos de um 'guitar man', menino!"

Suspicious Minds (1968)


Assim que você ouve a introdução, em qualquer lugar e a qualquer hora, você para o que está fazendo e ouve até o final. Essa música é uma a obra-prima de composição, interpretação, arranjo e produção, e um dos grandes momentos da música pop.
Melhor momento: Basicamente, a música toda. Mas o break a 1:47, quando Elvis canta: "Deixe nosso amor sobreviver / ou seque as lágrimas de nossos olhos", é capaz de derrubar qualquer um.

The Wonder of You (1970)


Gravada ao vivo em Las Vegas, em 1970. Poucas canções representam a opulência e ambição da música de Elvis dos anos 70 – que muitos, infelizmente, insistem em categorizar de cafona e música de menor qualidade.
Melhor momento: Elvis se esforça muito para cantar um "Oh, oh, oh, oh!" a 1:40, mostrando que não era o mesmo cantor de dez anos antes, mas exibindo uma faceta um tanto vulnerável e humana. Um grande momento imperfeito do Rei.

I've Lost You (1970)


Elvis sempre levou sua vida pessoal para os palcos e os discos. Essa é uma das mais tristes canções já escritas sobre a desintegração de um casamento, e foi gravada por Elvis no momento em que sua união com Priscilla Presley estava em queda livre.
Melhor momento: Difícil bater, em emoção, a segunda vez que Elvis canta o refrão: "Ooohh… I've lost you, Yes I´ve lost you", a 1:15.

You Don't Have to Say You Love Me (1972)


A versão de Dusty Springfield, gravada em 1966, era a suprema canção de dor de cotovelo. Mas Elvis conseguiu fazer uma versão ainda mais desesperançada, em parte porque sua interpretação, imperfeita e até ofegante, transmitia ao ouvinte uma melancolia que transcendia a letra da música. Foi o último grande sucesso do Rei.
Melhor momento: É impossível não se emocionar no fim da canção, a 2:14, quando Elvis implora para que acreditemos nele: "Believe me / believe me!" Quem não acreditaria nele?

Sobre o autor

André Barcinski é jornalista, roteirista e diretor de TV. É crítico de cinema e música da “Folha de S. Paulo”. Escreveu sete livros, incluindo “Barulho” (1992), vencedor do prêmio Jabuti de melhor reportagem. Roteirizou a série de TV “Zé do Caixão” (2015), do canal Space, e dirigiu o documentário “Maldito” (2001), sobre o cineasta José Mojica Marins, vencedor do Prêmio do Júri do Festival de Sundance (EUA). Em 2019, dirigiu a série documental “História Secreta do Pop Brasileiro”.

Sobre o blog

Música, cinema, livros, TV, e tudo que compõe o universo da cultura pop estará no blog, atualizado às terças-feiras.