Topo

Ele fez “O Exorcista” e depois foi para o inferno de Hollywood

André Barcinski

24/10/2016 05h59

friedkinO cineasta norte-americano William Friedkin, 81, será um dos homenageados da 40ª Mostra de Cinema de São Paulo. O festival exibirá sete filmes do diretor, que virá ao Brasil para ministrar uma "masterclass" no dia 30 (veja a programação aqui).

Um dos grandes nomes do cinema hollywodiano, Friedkin teve seu auge nos anos 1970, quando dirigiu clássicos como "Operação França" (1971) e "O Exorcista" (1973). Mas sua carreira sofreria um duro golpe com o fracasso de "O Comboio do Medo" (1977), um grande filme, mas que deu o azar de ser lançado um mês antes de "Guerra nas Estrelas".

"O Comboio do Medo" ("Sorcerer") é um "thriller" sobre um grupo de fugitivos da Justiça que aceita uma missão quase suicida de transportar uma carga de nitroglicerina em caminhões no meio de uma floresta na América do Sul. Há dois anos, quando o filme foi relançado em DVD, escrevi:

Em sua autobiografia, "The Friedkin Connection", o cineasta lista algumas razões para o fracasso do filme: "'Guerra nas Estrelas', que era pura fantasia, com mocinhos e bandidos claramente definidos, havia mudado o gosto do público; 'Sorcerer' foi apresentado como um filme realista e brutal; os quatro personagens principais eram fugitivos da Justiça; o título era enganoso ("Sorcerer" quer dizer "Feiticeiro", e muita gente achou tratar-se de um filme de terror, especialmente depois de "O Exorcista"); e o fim não era só ambíguo, mas melancólico."

O resultado é que "Sorcerer" mudou a carreira de Friedkin para sempre. Ele foi despedido da Universal, virou persona non grata em vários estúdios e seus filmes passaram a ter enorme dificuldade de fazer sucesso. "Meus filmes se tornaram mais obsessivos, menos acessíveis ao público e se tornariam ainda mais sombrios no futuro."

Friedkin continuou a fazer ótimos filmes, mas nunca mais teve sucesso comercial. "Parceiros da Noite" (1980), "thriller" policial em que Al Pacino faz um detetive que se infiltra no submundo gay sadomasô nova-iorquino para investigar um assassino serial, causou polêmica por sua violência e irritou grupos de defesa dos direitos gays. "Viver e Morrer em Los Angeles" (1985), um filme policial espetacular – e com uma sequência de perseguição de carros que periga ser melhor que a de "Operação França" – também fracassou na bilheteria.

Recentemente, Friedkin fez um filme de baixo orçamento e que quase ninguém viu, mas que está entre seus melhores: "Killer Joe – Matador de Aluguel", uma bizarra história de humor negro sobre um traficante chamado Chris (Emile Hirsch) que decide dar um golpe no seguro e matar a própria mãe. Para isso, conta com uma forcinha do pai, um cretino chamado Ansel (Thomas Haden Church, de "Sideways") e da mulher dele, Sharla, uma periguete safada interpretada pela sensacional Gina Gershon. Mas o melhor personagem do filme é o tal Killer Joe (Matthew McConaughey), um policial e assassino de aluguel que fica babando pela ninfeta Dottie (Juno Temple), irmã de Chris. Fridkin não estava brincando quando disse que seus filmes mais recentes eram "os ais sombrios" de sua carreira.

Em 2013, o cineasta lançou sua autobiografia, "The Friedkin Connection" (leia aqui um texto que fiz sobre o livro). No mesmo ano, escrevi para a "Folha de S. Paulo" uma análise sobre o aniversário de 40 anos de "O Exorcista" e o impacto do filme (leia aqui).

Infelizmente não estarei em São Paulo no dia 30 para ver a "masterclass" de William Friedkin, mas quem tiver chance não deveria perder.

Sobre o autor

André Barcinski é jornalista, roteirista e diretor de TV. É crítico de cinema e música da “Folha de S. Paulo”. Escreveu sete livros, incluindo “Barulho” (1992), vencedor do prêmio Jabuti de melhor reportagem. Roteirizou a série de TV “Zé do Caixão” (2015), do canal Space, e dirigiu o documentário “Maldito” (2001), sobre o cineasta José Mojica Marins, vencedor do Prêmio do Júri do Festival de Sundance (EUA). Em 2019, dirigiu a série documental “História Secreta do Pop Brasileiro”.

Sobre o blog

Música, cinema, livros, TV, e tudo que compõe o universo da cultura pop estará no blog, atualizado às terças-feiras.