Teenage Fanclub e a maldição das bandas que insistem em sobreviver
Acaba de sair "Here", décimo disco de estúdio da banda escocesa Teenage Fanclub (ou 11º, se você contar "The King", lançado em 1991 com sobras de estúdio e meio que renegado pela própria banda).
O Teenage Fanclub tem 27 anos de estrada e nunca gravou uma música ruim. Já foi associado ao "shoegaze" de My Bloody Valentine e Ride, e ao "grunge" de Nirvana e Mudhoney, mas na verdade faz um power pop bonito, com grandes influências de Neil Young e Big Star.
A banda se diferencia da concorrência por ter três compositores, que se revezam nos vocais e créditos dos discos: os guitarristas Norman Blake e Raymond McGinley, e o baixista Gerard Love. "Here" tem 12 faixas – quatro de cada um.
Nessas quase quatro décadas, o Teenage Fanclub nunca estourou comercialmente. Esteve em vias de tornar-se uma banda grande quando abriu turnês do Nirvana e viu seu disco "Bandwagonesque" ganhar listas de melhores de 1991, mas cometeu um grande pecado comercial: não acabou quando deveria e voltou alguns anos mais tarde, ganhando cachês muito maiores e tocando em grandes festivais.
Se Blake, Love e McGinley estivessem interessados só em dinheiro e tivessem um empresário esperto, teriam se separado lá por 1996, depois de lançar três álbuns sensacionais ("Bandwagonesque", "Thirteen" e "Grand Prix"), dado um tempo criando ovelhas na Escócia e retornado uns dez anos depois, como atração em festivais como Primavera ou Coachella. Mas não foi o que aconteceu. A banda persistiu, continuou lançando discos ótimos e fazendo shows para públicos cada vez menores e mais fiéis. Hoje tem uma base sólida, porém pequena de fãs.
Vale comparar o caso do Teenage Fanclub com o de seus contemporâneos do My Bloody Valentine, por exemplo. Em 1991, mesmo ano de "Bandwagonesque", o MBV lançou o clássico "Loveless". Devido ao perfeccionismo e teimosia do líder da banda, o guitarrista Kevin Shields, o disco levou três anos para ser completado, custou meio milhão de dólares e quase faliu a gravadora Creation. Lançado, fracassou nas paradas, atingindo apenas o número 24 na Inglaterra ("Bandwagonesque" chegou a 22º). Deprimido, Shields sumiu, e a banda acabou. O disco seguinte, "MBV", levaria 22 anos para sair.
Sem querer comparar a importância, talento e influência das duas bandas, é curioso notar que o My Bloody Valentine ficou fora dos palcos por 16 anos e só voltou a fazer shows em 2008, faturando cachês de centenas de milhares de dólares para tocar em festivais para públicos que nunca tivera na época de "Loveless", enquanto o Teenage Fanclub continuava a tocar em clubes para 300 a 500 pessoas.
Vamos imaginar o cenário inverso: o Teenage Fanclub lança "Bandwagonesque", Norman Blake tem um surto psicótico e a banda fica 22 anos sem lançar um disco. Enquanto isso, o My Bloody Valentine continua excursionando e lançado um disco a cada dois ou três anos. Será que "Loveless" teria todo o status mítico que hoje possui? E "Bandwagonesque", não seria considerado um dos maiores clássicos do indie dos anos 90?
É grande a lista de bandas comercialmente amaldiçoadas por terem sobrevivido. Pense em quão grande seria o Mudhoney se tivesse acabado em 1995, logo após o suicídio de Kurt Cobain, depois vendido a faixa "Touch Me I'm Sick" para algum comercial de remédio e voltado lá por 2001, numa turnê comemorativa dos dez anos de explosão do "grunge"?
O que teria acontecido com o Primal Scream se tivesse dado um tempo depois de "Screamadelica" (1991)? Ou o Dandy Warhols depois de "Welcome to the Monkey House" (2003)? Que tal o Ministry? The Fall? Melvins? Flaming Lips? Imagine se o Sonic Youth voltar daqui a alguns anos?
Que a cultura da nostalgia é fortíssima, não há dúvida: basta ver que o LCD Soundsystem ficou menos de DOIS ANOS fora do mercado (entre abril de 2014, com um disco ao vivo chamado "The Last Goodbye", e dezembro de 2015, com o single "Christmas Will Break Your Heart"), e voltou como headliner do Coachella, ou que o Pixies, banda muito influente, porém não tão popular, voltou tocando em Lollapaloozas da vida para públicos de 50 mil pessoas.
Artistas que não se rendem a essa esperteza precisam ter muita força de vontade e a consciência de que vale a pena apostar na longevidade. Está aí o disco novo – e ótimo – do Teenage Fanclub para provar.
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