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Nobel de Dylan: um prêmio para a música

André Barcinski

13/10/2016 10h02

91A2mjfVBhLBob Dylan ganhou o Nobel de literatura em 2016. É o primeiro músico a vencer o Nobel nos 115 anos de existência do prêmio. E já começaram as indagações: foi merecido? Ele é escritor ou músico? Há escritores mais merecedores do prêmio?

A exemplo de qualquer premiação, o Nobel tem características próprias e subjetivas. Arte não é corrida de Fórmula 1, que sempre tem vencedores e derrotados. É impossível comparar objetivamente o trabalho feito por autores de estilos, origens e meios diferentes. Dylan faz letras de canções, carregadas de poesia e simbolismo; já Svetlana Alexievich, a ucraniana vencedora do Nobel do ano passado, faz relatos jornalísticos. Um é "melhor" que o outro?

A subjetividade das escolhas do Nobel fica evidente na lista de grandes autores que nunca levaram o prêmio: Tolstói, Henry James, Proust, James Joyce, Mark Twain, Nabokov, Virginia Woolf…

Analisando os vencedores recentes, chama a atenção a preocupação do Nobel em pulverizar a premiação por diferentes regiões do planeta. De 1995 a 1999, o Nobel premiou cinco autores europeus em sequência (Seamus Heaney, Wislawa Szymborska, Dario Fo, José Saramago e Gunter Grass). Em anos recentes, essa dominação continental duradoura não tem ocorrido.

Voltando a Dylan: se existe um nome da música que merece um Nobel de literatura, é ele (vale lembrar que o Nobel premia autores em vida). Nenhum autor contemporâneo fez tanto para elevar a música pop – aquela que toca em rádio, de apelo popular – ao nível de grande arte. Suas letras capturaram o espírito de suas épocas e marcaram gerações.

A escolha de Dylan também pode ser vista como política, se lembramos que os Estados Unidos não ganhavam um Nobel desde 1993, com Toni Morrison. Mesmo assim, se a ideia era premiar um norte-americano, a escolha foi polêmica, já que Philip Roth, Cormac McCarthy, Don De Lillo, Thomas Pynchon e Joyce Carol Oates, todos nascidos nos Estados Unidos, nunca ganharam o Nobel.

E aos fãs de Haruki Murakami, que torciam por ele, um consolo: o último japonês a vencer o Nobel de Literatura foi Kenzaburo Oe, em 1994. Será 2017 o ano de Murakami?

P.S.: Hoje é mesmo o dia de Dylan. Terminei de escrever o texto acima, chamei um táxi, e o motorista se chamava Ricardo ZIMMERMANN. O carro andou algumas quadras, e demos de cara com essa placa:

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Excelente tarde a todos.

Sobre o autor

André Barcinski é jornalista, roteirista e diretor de TV. É crítico de cinema e música da “Folha de S. Paulo”. Escreveu sete livros, incluindo “Barulho” (1992), vencedor do prêmio Jabuti de melhor reportagem. Roteirizou a série de TV “Zé do Caixão” (2015), do canal Space, e dirigiu o documentário “Maldito” (2001), sobre o cineasta José Mojica Marins, vencedor do Prêmio do Júri do Festival de Sundance (EUA). Em 2019, dirigiu a série documental “História Secreta do Pop Brasileiro”.

Sobre o blog

Música, cinema, livros, TV, e tudo que compõe o universo da cultura pop estará no blog, atualizado às terças-feiras.