Dia das Crianças: quem escolhe os filmes que seus filhos vão ver?
Um jornal me pediu uma lista de indicações de filmes e séries de TV para o Dia das Crianças.
Minha idéia era sugerir atrações menos conhecidas e de alta qualidade. Pensei logo em "Ponyo – Uma Amizade Que Veio do Mar", o maravilhoso desenho animado do japonês Hayao Miyazaki, e no DVD com episódios da série original do "Sítio do Picapau Amarelo", exibida pela Rede Globo nos anos 1970 e 1980. Também não poderia ficar de fora a versão original de "A Fantástica Fábrica de Chocolate" (1971), com Gene Wilder.
O passo seguinte foi contatar assessorias de imprensa de exibidoras de TV a cabo, serviços de streaming e distribuidoras de DVDs e Blu-Rays, pedindo a lista de filmes disponíveis.
Foi aí que começaram os problemas: ignorando o pedido, as assessorias de imprensa não enviaram a lista completa de filmes e séries, mas apenas uma pequena seleção. E tome "A Era do Gelo", "Frozen", "Zootopia" e "Alvin e os Esquilos".
Respondi que precisava da lista toda, já que a ideia era indicar atrações que muitas crianças ainda não conheciam.
Não adiantou: quase todas as assessorias responderam de forma semelhante: "Essa é a seleção que estamos divulgando". Elas não queriam fornecer o que estávamos pedindo, mas o que elas queriam ver divulgado. No caso das fornecedoras de programação a cabo, a seleção incluía, prioritariamente, atrações oferecidas a um custo extra de locação, além da mensalidade já paga pelos clientes.
Continuei insistindo. Algumas assessorias finalmente desistiram de tentar impor suas escolhas e enviaram seus catálogos completos, mas outras simplesmente ignoraram o pedido. "Isso é para facilitar o seu trabalho", foi a resposta.
Claro que as assessorias de imprensa estão só fazendo o trabalho delas, que é conseguir o maior espaço jornalístico possível para seus clientes. Mas é assustador perceber como o papel delas tem mudado nos últimos anos. Em vez de "assessorar" o jornalista, elas o tratam, cada vez mais, como um empregado, alguém que simplesmente existe para replicar o conteúdo criado pelas assessorias.
Muitos jornais, revistas e sites têm aceitado essa situação. Com as seguidas demissões em massa de jornalistas e a consequente diminuição do tamanho das redações, o aumento no número de horas trabalhadas por jornalistas e o surgimento de incontáveis órgãos de imprensa que se prestam a ser meros divulgadores de material promocional, o jornalismo Copy/Paste está dominando o mercado.
Quer um exemplo? Veja o texto que as assessorias de imprensa estão usando para divulgar o lançamento, na TV a cabo, do filme "A Era do Gelo: o Big Bang":
'A Era do Gelo: O Big Bang' narra a série de acontecimentos cósmicos que ameaçam A Era do Gelo, após Scrat chegar ao universo em busca da sua noz. Sid, Manny, Diego e os demais personagens devem deixar suas casas e embarcar em uma aventura.
Experimente copiar o parágrafo – inteiro ou em partes – faça uma busca na Internet, e você terá uma ideia de como o jornalismo Copia/Cola está disseminado por aqui. Também vai perceber como boa parte das matérias jornalísticas de dicas – sejam de filmes, livros, viagens ou restaurantes – dependem da "mãozinha" de assessorias.
O resultado é que muita gente lê essas matérias de "dicas" sem saber que, na verdade, está lendo propaganda. E propaganda do pior tipo: disfarçada de sugestão espontânea e livre de qualquer interesse comercial.
Bom Dia das Crianças a todos. O blog volta na sexta-feira.
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